O princípio da universalidade estabelece que, sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora de Portugal (art. 15.º do Código do IRS).
Para o efeito, são tidos em conta os rendimentos de todos os membros do agregado familiar.
Conceito de Residente Fiscal em Portugal
Com a crescente globalização e mobilidade, mais pessoas estão em busca de novas oportunidades além-fronteiras, seja por meio de trabalho remoto, investimentos ou mesmo residência parcial noutros países. Nesse contexto, é crucial compreender o conceito de residente fiscal em Portugal.
São residentes fiscais em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos (art. 16.º do CIRS):
- Tenham permanecido em Portugal mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, num período de 12 meses com início ou fim no ano em causa;
- Tendo permanecido em Portugal menos de 183 dias, disponham de habitação própria ou arrendada em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual, num qualquer dia do período de 12 meses referido na alínea anterior;
- Em 31 de dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, que estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direção efetiva em Portugal;
- Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de carácter público, ao serviço do Estado Português;
- Tenham nacionalidade portuguesa, mas com residência fiscal noutro país, território ou região, sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável que conste da lista de países aprovada pela Portaria n.º 150/2004.
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Onde são tributados os rendimentos obtidos no estrangeiro
Um residente fiscal que aufira rendimentos do estrangeiro está sujeito a tributação no seu país de residência fiscal mas também no país de onde são provenientes esses rendimentos.
Apesar do enquadramento fiscal dos rendimentos em ambos os países, isso não significa, necessariamente, que se pague imposto duas vezes sobre o mesmo rendimento.
Existem convenções de dupla tributação internacional entre Portugal e um grande número de países. Estes acordos bilaterais são estabelecidos com o objetivo de reduzir ou eliminar a dupla tributação.
Por outro lado, o art. 81.º do CIRS estabelece um mecanismo unilateral que reduz ou elimina a dupla tributação, dando aos titulares de rendimentos obtidos no estrangeiro o direito a um crédito de imposto correspondente à menor das seguintes importâncias:
- Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;
- Fração da coleta do IRS, calculada antes da dedução, correspondente aos rendimentos tributáveis no país de origem, líquidos das deduções específicas previstas no CIRS.
Se existir convenção de dupla tributação entre Portugal e o país de origem dos rendimentos, o crédito de imposto não pode ser superior ao imposto pago no estrangeiro.
Pode consultar no portal da AT as convenções para evitar a dupla tributação.
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Anexo J: Quem está obrigado a entregar e como preencher
Devem ser declarados no Anexo J da Declaração Modelo 3 do IRS todos os rendimentos obtidos no estrangeiro, entre os quais, relacionados com trabalho dependente, pensões, rendimentos profissionais, prediais e capitais.
Os titulares, beneficiários ou autorizados de contas bancárias no estrangeiro também estão obrigados à entrega do Anexo J.
Este anexo é individual, ou seja, se no agregado familiar houver mais do que um membro a receber rendimentos do estrangeiro, deve ser apresentado um anexo para cada titular.
No preenchimento do Anexo J deve indicar os valores em euros. Sempre que estes valores sejam pagos em moeda estrangeira, é necessário convertê-los para euros.
Para o efeito, a taxa de câmbio a usar será (art. 23.º do CIRS):
- Taxa de câmbio de compra à data do pagamento dos rendimentos; ou
- Taxa de câmbio de compra em 31 de dezembro do ano em que os rendimentos foram pagos, quando não é possível determinar a data de pagamento.
Titulares de contas em bancos estrangeiros ou em sucursais de bancos nacionais no estrangeiro
O contribuinte que seja titular ou que possa movimentar conta aberta em instituição financeira estrangeira ou em sucursal de banco português no estrangeiro, tem a obrigação de declará-la à AT (n.º 8 do art. 63.º-A da Lei Geral Tributária).
Se tem, por exemplo, uma conta Revolut, N26, OpenBank ou Bunq, deve identificar o respetivo IBAN e BIC no Quadro 11 do Anexo J.
Os saldos e os movimentos da conta não são declarados, esclarecendo o Ofício Circulado n.º 20211 que se trata de uma mera identificação da conta, não tendo qualquer impacto na liquidação do imposto (IRS).
Esta obrigação recai sobre as contas em instituições que são, formalmente, consideradas instituições bancárias. As contas em instituições de pagamento, como a Wise Europe S.A., não estão sujeitas a esta obrigação.
Se tem dúvidas relativamente a uma instituição ou conta no estrangeiro, consulte a lista das instituições autorizadas pelo Banco de Portugal.
Titulares de rendimentos obtidos no estrangeiro
O Anexo J agrega todas as categorias de rendimentos obtidos no estrangeiro. Assim, se for titular de rendimentos de diversas naturezas, só entrega um anexo, preenchendo os quadros que se aplicarem ao seu caso concreto.
Note que terá de entregar um anexo J para cada titular de rendimentos do estrangeiro pertencente ao seu agregado familiar, caso opte pela tributação conjunta ou tenha dependentes com este tipo de rendimentos.
O Quadro 4 destina-se aos rendimentos de Trabalho Dependente - Categoria A.
Inclui-se nesta categoria o trabalho por conta de outrem prestado por um residente fiscal no território português a uma entidade estrangeira privada ou pública. É o caso, por exemplo, de um trabalhador remoto que exerça as suas funções através de meios eletrónicos para uma entidade patronal estrangeira.
Se reunir as condições para beneficiar do regime fiscal aplicável a ex-residentes (art. 12.º-A do CIRS) que isenta de tributação 50% dos rendimentos do trabalho dependente, durante 5 anos, até ao limite superior do primeiro escalão (7.703 € em 2024), deve indicar o ano em que se tornou residente no campo 491 do Quadro 4D.
O Quadro 5 destina-se aos rendimentos de Pensões - Categoria H.
Incluem-se nesta categoria as pensões de aposentação ou reforma; pensões de velhice, invalidez ou sobrevivência, pagas por entidades estrangeiras privadas ou públicas.
Também se enquadram nesta categoria prestações de seguros, fundos de pensões ou outras entidades, devidas no âmbito de regimes complementares de segurança social e que não se enquadrem na categoria A.
As pensões de alimentos e as rendas temporárias e vitalícias devem, igualmente, ser declaradas neste quadro.
Note que a pensão de alimentos (código H03) é tributada autonomamente à taxa de 20%. No Quadro 5D deve indicar se opta, ou não, pelo englobamento deste rendimento. Se englobar, este valor vai ser tributado em conjunto com os seus rendimentos de outras categorias. Escolha a situação que lhe for mais favorável.
O Quadro 6 destina-se aos rendimentos obtidos no estrangeiro no âmbito de uma atividade profissional, isto é, Rendimentos Profissionais - Categoria B.
Esta categoria engloba atividades de diversas naturezas que vão desde as atividades comerciais, industriais, agrícolas, silvícolas ou pecuárias às desportivas, artísticas ou propriedade intelectual.
Os rendimentos comerciais obtidos no estrangeiro com trading ou mineração de criptoativos também se enquadram nesta categoria.
Devem ser também declarados neste quadro, os rendimentos profissionais gerados por Herança Indivisa. Nesta situação, indique a linha do Quadro 6A que corresponde ao rendimento da herança no Quadro 6B.
O Quadro 7 destina-se aos Rendimentos Prediais - Categoria F e o Quadro 8 aos Rendimentos de Capitais - Categoria E obtidos no estrangeiro.
No Quadro 9 deverá declarar os Incrementos Patrimoniais - Categoria G obtidos fora do território português.
Se o englobamento dos incrementos patrimoniais for obrigatório como, por exemplo, para a cessão onerosa de posições contratuais em contratos relativos a bens imóveis, deverá preencher o Quadro 9.1.
Se o englobamento dos incrementos patrimoniais for opcional como, por exemplo, para resgates ou alienação de unidades de participação, ou liquidação de fundos de investimento estrangeiros, deverá preencher o Quadro 9.2.
Se optou por efetuar pagamentos por conta para compensar o facto de as entidades devedoras dos rendimentos não estarem obrigadas a fazer retenções na fonte de IRS, deve indicar no Quadro 9.3 o valor dos pagamentos por conta relativos ao ano a que respeita a declaração.
No Quadro 9.4A deve indicar a alienação onerosa de criptoativos, que não constituam valores imobiliários, detidos há menos de 365 dias, ou cujo detentor tenha perdido a qualidade de residente em Portugal.
No Quadro 9.4B deve indicar se opta, ou não, pelo englobamento. Escolha a situação que lhe for mais favorável.
Se nos diversos quadros do Anexo J indicou rendimentos relativos a anos anteriores (n.º 1 e n.º 3 do art. 74.º do CIRS), preencha o Quadro 10.
Sugerimos a visualização do vídeo da AT sobre o Anexo J.
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Economista e Contabilista Certificada, licenciada em Organização e Gestão de Empresas pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Exerce atividade na área da Consultoria para os Negócios e a Gestão desde 1997. Desempenha as funções de Consultora Sénior e CEO na sociedade VVL Consultores da qual é sócia fundadora.
A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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