Rendimentos

Ato isolado: Saiba o que fazer, quais os impostos e como declarar

Emitir um ato único implica cumprir uma série de regras. Pagar ou não IVA? É ou não tributado em IRS? Saiba com o que pode contar.

Emitir um ato único implica cumprir uma série de regras. Pagar ou não IVA? É ou não tributado em IRS? Saiba com o que pode contar.

Fez um serviço extra ou uma venda, precisa de faturar e não tem atividade aberta nas Finanças? Existe uma solução. Neste artigo explicamos o que é o ato isolado e os aspetos fiscais relacionados.

Definição de Ato Isolado

O ato isolado é frequentemente designado por ato único e, tal como o nome indica, corresponde a uma operação única, esporádica, sem continuidade e sem previsibilidade de voltar a ocorrer.

Quem presta um serviço ou efetua uma venda nestas condições pode passar uma fatura sem necessidade de dar início de atividade como trabalhador independente ou empresário em nome individual, nem de inscrição da atividade na Segurança Social. 

O ato isolado não pode ultrapassar o valor de 25.000 euros (valor sem IVA), segundo o n.º 3 do art. 31.º do CIVA - Código do IVA. Caso o serviço ou a venda a executar seja de valor superior a este limite, é obrigatório dar início de atividade na AT, mesmo que se trate de uma transação excecional e que não voltará a ocorrer.

Se tiver de entregar a declaração de início de atividade, indique na primeira questão do formulário que prevê emitir apenas uma fatura ou fatura-recibo. Esta declaração produz efeitos apenas para este ato.

Alguns exemplos de situações em que podem ser emitidos atos isolados:

  • Um estudante, sem atividade profissional, nas suas férias de verão, faz demonstração de iogurtes da marca X em supermercados. A prestação de serviços limita-se ao período de quatro semanas e não terá continuidade. Este estudante pode emitir um ato isolado no final do prazo estabelecido para a prestação de serviços;
  • Um pensionista, sem atividade profissional, para obter um rendimento extra, decide vender a madeira de uns eucaliptos existentes num terreno do qual é proprietário a uma empresa produtora de paletes. A venda da madeira é uma operação esporádica, que não se repetirá, pelo constitui um ato isolado;
  • Um trabalhador por conta de outrem, sem qualquer outra atividade profissional em nome individual, tem o hobby da fotografia e é convidado para dar um workshop  por ser um fotógrafo amador reconhecido. Sendo o workshop uma atividade com a duração de apenas 8 horas, poderá emitir um ato isolado por se tratar de uma situação pontual.

Se possuir atividade registada nas Finanças como trabalhador independente ou empresário em nome individual, não pode emitir um ato isolado. 

Nesta situação, deve apresentar uma declaração de alteração da atividade no Portal da AT, acrescentando o código da atividade que corresponde ao tipo de operação que pretende executar. Para o efeito deve consultar a tabela de atividades do art. 151.º do CIRS (rendimentos profissionais) ou a Classificação Portuguesa das Atividades Económicas - CAE Revisão 3 do INE (rendimentos empresariais). 

Se esteve registado e cessou a atividade no ano da cessação e após essa data, não é possível a prática de um ato isolado, sendo necessário reiniciar a atividade.

Leia ainda: Como anular um ato isolado

Quantos atos isolados se podem emitir?

Não existe uma resposta imediata e consensual para esta questão. A lei é ambígua nesta matéria: por um lado, o n.º 3 do art. 3.º do CIRS refere que se consideram rendimentos provenientes de atos isolados os que não resultem de uma prática previsível ou reiterada, não estabelecendo um limite objetivo para o número de atos; por outro lado, a alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do CIVA refere claramente “uma só operação tributável”.

A lógica subjacente ao ato isolado, ou ato único, é a realização de apenas uma operação, tal como refere o Código do IVA, no entanto, a ambiguidade da lei abre margem para a existência de dúvidas em determinadas situações. Existem alguns casos em que foram emitidos dois atos únicos no mesmo ano, embora para entidades diferentes. 

Assim, sempre que houver a necessidade de emissão de mais de um documento quando a operação não é previsível ou reiterada, o mais aconselhável é colocar a questão diretamente à AT: online via e-Balcão, telefonicamente via CAT, ou junto de um Serviço de Finanças por e-mail ou presencialmente. Dê preferência a um meio que permita uma resposta por escrito (e-Balcão ou e-mail) para, no futuro e em caso de dúvida, poder justificar perante a AT as opções que tomou.

Leia ainda: Recibos verdes ou ato isolado: Como escolher e preencher

Documentos a emitir no Ato Isolado

Quando se presta um serviço ou ocorre uma venda ocasional é necessário emitir um documento que titule a operação. O mais comum é: 

  • Emissão de uma fatura com a realização da operação e emissão de um recibo com a liquidação dessa fatura por parte do adquirente;
  • Emissão de uma fatura-recibo quando o pagamento é efetuado no momento da realização da operação.

O documento deve ser emitido até ao 5.º dia útil após a conclusão do serviço ou da data em que o bem vendido é colocado à disposição do adquirente (art. 36.º do CIVA).

A emissão da fatura e recibo ou da fatura-recibo através do Portal da AT é a forma mais simples e célere de cumprir esta obrigação fiscal.

Aceda ao Portal da AT com as suas credenciais de acesso, em “Serviços Frequentes” escolha “Faturas e Recibos” > “Emitir” > “Fatura ou Fatura-Recibo”. Se preferir usar um atalho, coloque “Emitir Faturas” no campo de pesquisa do Portal da AT.

Introduza a data de realização do serviço ou da venda e escolha o tipo de documento (fatura ato isolado ou fatura-recibo ato isolado). O sistema assume automaticamente que se trata de ato isolado quando não existe registo de atividade para o seu NIF (número de contribuinte). 

Selecione prestação de serviços ou transmissão de bens, consoante o caso e, a seguir, preencha os dados relativos ao adquirente. Descreva o serviço ou os bens transacionados, indique o valor base (sem IVA) e selecione o regime de IVA. Quando todas as informações estiverem preenchidas, verifique se está tudo correto e clique em “Emitir”.

No caso da emissão de uma fatura, quando tiver necessidade de emitir o respetivo recibo, deve repetir os passos indicados para a emissão de faturas, mas deve selecionar “Recibo - Emita aqui um recibo associado a uma Fatura já emitida”. No Recibo deve indicar o enquadramento em sede de IRS.

A fatura ou fatura-recibo emitida no Portal da AT é comunicada automaticamente, dispensando o contribuinte da obrigação de comunicação de faturas (e-Fatura) até ao quinto dia do mês seguinte ao da emissão da fatura.

Em casos específicos pode haver lugar à autofaturação, situação em que se dá a inversão do sujeito passivo, com o adquirente a substituir-se ao fornecedor na emissão da fatura. Ou seja, em determinados casos, como sucede com a venda de madeira por um particular a uma empresa (sujeito passivo de IRC) ou a um empresário (sujeito passivo de IRS), é o comprador que emite a fatura relativa ao ato isolado do prestador de serviços ou vendedor.

Leia ainda: Ato isolado: O que é e como emitir

Enquadramento fiscal do Ato Isolado

Apesar de o ato isolado se tratar de uma operação única, existem regras a cumprir no que respeita à tributação dos rendimentos obtidos.

O Ato Isolado em sede de IVA

Todos os atos isolados estão sujeitos a IVA, independentemente do seu valor, com exceção dos que se enquadram nas atividades isentas do artigo 9.º do CIVA como, por exemplo, os serviços médicos.

A taxa de IVA mais frequente é a normal (23%) mas também se podem aplicar a intermédia (13%) e a reduzida (6%) consoante a natureza da operação, de acordo com o art. 18.º do CIVA. 

Note que nas Regiões Autónomas as taxas são diferentes das do Continente:

  • Madeira - 22%, 12% e 5%;
  • Açores - 16%, 9% e 4%. 

Um ato isolado terá, no máximo, o valor de 25.000 euros + IVA à taxa aplicável.

O IVA de um ato isolado deve ser pago à AT até ao último dia do mês seguinte ao da conclusão da operação (n.º 2 do art. 27.º do CIVA). Ou seja, se passar a fatura ou fatura-recibo do ato isolado em 15 de abril, tem até 31 de maio para pagar o imposto ao Estado.

Como efetuar o pagamento do IVA?

Em primeiro lugar, deve emitir a Guia Modelo P2: entre no Portal da AT com os seus dados de acesso e vá a “Cidadãos” > “Serviços” > “Pagamentos Antecipados de IVA” > “Guias de Pagamento Modelo P2” > “Submissão de Documento de Pagamento”. Se preferir usar um atalho escreva “Guia P2” no campo de pesquisa do Portal da AT.

Com a guia emitida, efetue o pagamento num dos locais de cobrança autorizados:

  • Serviço homebanking - através do site do seu banco (Pagamentos ao Estado);
  • Multibanco - em Pagamentos ao Estado (garanta que o MB emite recibo);
  • Tesourarias dos Serviços de Finanças (por cheque, multibanco ou em numerário);
  • Balcões dos CTT (por cheque, multibanco ou numerário).

Deve guardar o comprovativo do pagamento junto da Guia P2.

Tenha em atenção que o IVA pago fora do prazo está sujeito a coima nunca inferior a 25 euros, calculada com base no valor do imposto em dívida (art. 26.º, n.º 1 e 2 do art. 114.º do RGIT - Regime Geral das Infrações Tributárias):

  • Atraso por negligência - coima de 15% a 50% do imposto em dívida, com limite de 22.500 euros;
  • Atraso por dolo - coima de 100% a 200% do imposto em dívida, com limite de 82.500 euros.

A esta coima acrescem juros compensatórios e juros de mora (art. 35.º e 44.º da LGT - Lei Geral Tributária).

Se o pagamento do imposto em falta for feito de forma voluntária, a coima pode ser reduzida ou dispensada em determinadas circunstâncias (artigos 29.º a 32.º do RGIT), mas é sempre preferível proceder ao pagamento dentro do prazo para evitar problemas.

Leia ainda: IRS: Passei um ato isolado, tenho que preencher o Anexo SS?

O Ato Isolado em sede de IRS

Para efeitos de IRS, o ato isolado enquadra-se na Categoria B - Rendimentos profissionais e empresariais.

Aplicam-se as regras do regime simplificado para determinação do rendimento tributável, ou seja, o rendimento sobre o qual vai incidir o cálculo do imposto (IRS) resulta da aplicação de coeficientes (art. 31.º do CIRS):

  • 0,15 - Vendas de mercadorias e produtos;
  • 0,75 - Rendimentos de atividades profissionais da tabela do art. 151.º do CIRS;
  • 0,35 - Rendimentos de prestações de serviços não incluídos na tabela do art. 151.º do CIRS.

Na prática, estes coeficientes determinam o valor considerado “lucro” e o valor das “despesas” da atividade.

Por exemplo, nas atividades em que se aplica o coeficiente 0,75, isto significa que 75% do rendimento é tributável, ou seja é considerado lucro, e 25% do rendimento corresponde ao valor de despesas. Assim, as despesas efetivamente suportadas com a operação não são dedutíveis, sendo para o efeito, considerada a dedução presumida pela aplicação do coeficiente.

O rendimento tributável é sujeito a englobamento e adicionado aos restantes rendimentos do sujeito passivo, caso existam. O rendimento coletável corresponde à soma dos diversos rendimentos líquidos da dedução específica e é este resultado que determinará a taxa de IRS a aplicar, de acordo com o escalão em que se enquadrar.

Se a prestação de serviços ultrapassar 14.500 euros (em 2024) e for efetuada a um adquirente nacional com contabilidade organizada, é obrigatório efetuar retenção na fonte de IRS

A retenção na fonte incide sobre o valor da prestação de serviços (as vendas de bens ou os materiais utilizados na prestação de serviços não estão abrangidos) e funciona como um adiantamento do imposto a pagar. Na altura da entrega da Modelo 3 de IRS é feito o acerto de contas entre o valor de imposto apurado no final do ano e o imposto retido na fonte.

As taxas de retenção na fonte sobre rendimentos obtidos com a prestação de serviços da categoria B são (art. 101.º do CIRS):

  • 25% para as atividades profissionais previstas na tabela do art. 151.º do CIRS;
  • 11,5% para as atividades empresariais e profissionais não incluídas na tabela do art. 151.º.

Como declarar o ato isolado na Modelo 3 de IRS 

Se emitiu um ato isolado, os rendimentos obtidos enquadram-se na categoria B, pelo que deve apresentar o Anexo B à declaração Modelo 3 de IRS.

Se o valor dos rendimentos obtidos através do ato isolado forem inferiores a 4 vezes o valor do IAS - Indexante dos Apoios Sociais (4 x 509,26 € = 2.037,04 € em 2024), e não auferir outros rendimentos ou apenas auferir rendimentos sujeitos a taxas liberatórias (previstas no art. 71.º do CIRS) como, por exemplo, os juros de depósitos bancários, está dispensado de apresentar o Anexo B. Neste caso, se for casado ou unido de facto não pode apresentar a declaração conjunta.

Quem estiver obrigado à entrega do Anexo B deve começar por preencher o Quadro 1, assinalando o Campo 02 - Ato Isolado.

No Quadro 3 deve indicar o NIF do titular dos rendimentos e o código da atividade (tabela do art. 151.º ou CAE).

No Quadro 4A indique o valor obtido (sem IVA) com a prestação de serviços ou da venda que deu origem ao ato isolado.

No Quadro 6 indique o NIF da entidade a quem prestou o serviço, que efetuou a retenção na fonte, e o respetivo valor, quando aplicável.

Preencha o Quadro 13B indicando o valor do ato isolado emitido (sem IVA) na coluna do ano N. Se emitiu atos isolados nos dois anos anteriores, preencha as colunas do ano N-1 (ano anterior) e do ano N-2 com os valores que lhes correspondem. Se não emitiu atos isolados nesses dois anos, preencha estas colunas com zeros.

Finalmente, o ato isolado não está sujeito a inscrição nem a contribuições para a Segurança Social, pelo que não é necessário entregar o Anexo SS.

Leia ainda: Anexos do IRS: Quais são e como preencher?

Economista e Contabilista Certificada, licenciada em Organização e Gestão de Empresas pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Exerce atividade na área da Consultoria para os Negócios e a Gestão desde 1997. Desempenha as funções de Consultora Sénior e CEO na sociedade VVL Consultores da qual é sócia fundadora.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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