Ter ou não dinheiro, eis a questão. Pelo menos, a questão que muitos ditados abordam. Diz-se que «Quando um perde, outro ganha», e talvez esta seja uma daquelas máximas difíceis de negar. A sabedoria popular, porém, preocupa-se com os que perdem muito, ou os que pouco têm. «Quando falta o dinheiro, falta tudo.» E, sem notas e moedas para se guardar, até os objetos perdem significado, como se evidencia no anexim listado por Francisco Roland, em 1841: «Bolsa sem dinheiro, chama-lhe couro.»
Estar carregadinho dele, isso é que era
A melhor situação, sem dúvida, é «estar cheio da gaita», que a coletânea do Reader’s Digest define com a maior simplicidade: ter dinheiro. E o mesmo pode ser dito de outras formas, como “Fulano está cheio” ou “Estar cheio de nota”. Às vezes, quando faltam recursos, as pessoas reúnem-se para «fazer uma vaquinha», que é como quem diz «dividir igualmente entre todos uma despesa qualquer». É mecanismo a que se recorre para resolver alguns assuntos, geralmente de pouca monta, mas a prática exige confiança no outro. E, quando falamos de dinheiros, isto dos princípios e da confiança pode ser um verdadeiro vespeiro. Não somos nós a afirmá-lo, claro; é o seguinte ditado: «Baratar a honra por dinheiro.»
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Nisto de dinheiros, que valem os princípios?
Há, de facto, quem esteja disposto a aviltar a honra por causa da nota. E não será nenhuma idiotice acharmos que existe gente que se atreve a «Ficar com o santo e a esmola», ditado que o livro dos Provérbios, Adágios, Rifãos, Anexins, Sentenças Morais e Idiotismos define como «[ficar] com a nota e o troco, com um no papo e outro no saco».
Mas, enfim, também há quem procure atuar sob a influência de valores mais elevados. «O dinheiro ganho com o trabalho honra a mão que o recebe», diz-se no Dicionário de Máximas, Adágios e Provérbios do Major Hespanha. Porém, neste campo das virtudes, sabemos que as palavras mais acutilantes serão sempre as do Conselheiro José Bastos: «O dinheiro, parecendo dar tudo, não pode dar a felicidade; é necessário pedi-la ao trabalho e à virtude.»
O perfil do dinheiro
Talvez as ideias do conselheiro possam ser lidas como um prémio de consolação para quem não tem muito na carteira. «Tem mais aquele que menos deseja. O sábio precisa de pouco, porque não cobiça muito.» O melhor seria existir um equilíbrio entre a forma de atuar e as moedinhas amealhadas. «Do dinheiro, e da verdade, a metade da metade», já se afirmava, em 1841, nos Adágios, Provérbios, Rifãos, e Anexins da Língua Portugueza.
Resta-nos tentar fixar a imagem que os ditados fazem do dinheiro. Que aparência terá? Em 1848, Paulo Perestrello da Câmara listava a «moeda safada», uma moeda «cujo cunho quasi não se distingue pelo uso, com a serrilha e cunhos gastos». Depois, três definições de uma assentada, retiradas daqui e dali:
Dinheiro não conhece dono.
Dinheiro não fala.
Dinheiro não tem cheiro.
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Mais valia tê-lo do que falar dele, mas enfim…
Também se diz que «o dinheiro não consente faltas», mas, e se for ele a faltar-nos? O Conselheiro Bastos tem mais umas ideias para partilhar connosco. Ele assegura que «o dinheiro é um bom escravo, e um mau senhor», portanto, temos de o domesticar e de não deixar que seja ele a guiar os nossos passos. O que, como todos bem sabemos, é mais fácil de dizer do que fazer, já que «o dinheiro é a mola real».
A prová-lo, o tanto que falámos dele. E ainda deixámos mais umas dúzias de provérbios de fora. Bom, bom, era que a quantidade de ditados correspondesse a zeros à direita na nossa conta bancária. Ficávamos todos milionários. Assim, talvez tenhamos ficado apenas um bocadinho mais ricos… de vocabulário.
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