Imobiliário

Devo financiar um house flip? O efeito do tempo

Com taxas de juro em alta, devo continuar a financiar os meus investimentos em house flip? E qual o efeito do tempo na rentabilidade obtida?

Já muito escrevi sobre o efeito da dívida nos investimentos imobiliários, nomeadamente sobre os efeitos e vantagens de recorrer a dívida para financiar investimentos imobiliários. Resumidamente:

  • Potencia um aumento da rentabilidade dos capitais próprios investidos;
  • Permite alcançar uma maior e melhor diversificação numa carteira de investimentos;
  • Pode originar um efeito de acumulação de património.

Num artigo escrito em Doutor Finanças, em dezembro de 2022, referia que «Em teoria, quanto mais dívida colocar num investimento, maior a rentabilidade gerada nos capitais próprios investidos. Claro está, maior também o risco. Por esta razão, o efeito da alavancagem pode ser interessante em alguns casos, porquanto permite a um investidor alcançar uma rentabilidade superior dos seus capitais próprios, além de lhe permitir fazer mais investimentos

Neste artigo, pretendo introduzir a variável tempo. Nas minhas aulas costumo referir que o tempo é o principal inimigo do investidor imobiliário. “Tempo é dinheiro”, costuma dizer-se. No investimento em imóveis, é mesmo!

Leia ainda: Qual o impacto do aumento dos juros nos preços na habitação?

O caso do house flip

No meu artigo de fevereiro deste ano, sobre “O efeito da alavancagem nos investimentos imobiliários”, dei como exemplo um investimento em buy-to-let e outro em house flip. Vimos que, no caso de um flip, uma vez que a rentabilidade do investimento era superior à taxa de juro, o efeito da alavancagem acabava por produzir o efeito pretendido.

No entanto, num cenário de taxas de juro em alta, o prazo do investimento assume ainda mais importância. Um investidor ser capaz de fazer o seu investimento em house flipping, alavancado, no mais curto espaço de tempo, torna-se muito importante.

Para entendermos melhor o efeito do tempo na rentabilidade do investidor, assumamos o seguinte caso teórico de um investimento num house flip:

  • Valor de aquisição: € 120.000
  • Custos de aquisição (IMT, IS, registos): € 3.341
  • Obras de remodelação: € 30.000
  • Valor de Venda: € 185.000
  • Custos de venda: 5% + IVA
  • Valor Patrimonial Tributário: € 60.000
  • Condomínio: € 25/mês
  • Seguros: € 25/mês

Quanto ao financiamento, assumi os seguintes pressupostos:

  • Taxa de juro: Euribor a 6 meses (3,8%) + 2%
  • Prazo: 10 anos
  • Custos iniciais: € 1.000
  • Regime das prestações constantes

Vamos comparar os resultados obtidos, nos casos de venda do imóvel no prazo máximo de 1 ou 2 anos, e em função de diferentes níveis de alavancagem. Em ambos os casos, e para efeitos de comparação direta, assumi a não isenção de IMT (sabendo que a compra para revenda está isenta até ao prazo de 1 ano):

Investimento a 1 ano


Nível de alavancagem

0%

30%

50%

80%

Equity investido

-154.151€

-123.544€

-90.869€

-52.299€

Dívida

0€

45.000€

75.000€

120.000€

Equity ganho

19.472€

15.487€

13.498€

10.513€

Múltiplo equity

1,13

1,13

1,15

1,20

TIR (equity)

12,70%

14,13%

16,92%

29,99%

Investimento a 2 anos

Nível de Alavancagem

0%

30%

50%

80%

Equity investido

-154.961€

-123.544€

-101.933€

-69.516€

Dívida

0€

45.000€

75.000€

120.000€

Equity ganho

18.662€

12.171€

8.510€

3.019€

Múltiplo equity

1,12

1,10

1,08

1,04

TIR (equity)

5,90%

5,25%

4,88%

3,41%

Os resultados obtidos, no caso de venda até 1 ano, são os esperados: quanto mais dívida, maior é a rentabilidade obtida do equity investido. Neste caso, o financiamento compensa, contribuindo para um aumento da rentabilidade. O múltiplo do equity também cresce à medida de maior alavancagem.

No entanto, as conclusões são diferentes no caso de venda até 2 anos. O facto de o investidor estar mais 1 ano a pagar prestações bancárias, faz com que tenha de investir mais equity, reduzindo o seu potencial de ganho. Assim, a rentabilidade do equity investido cai substancialmente, não compensando a alavancagem.

Neste caso, concluímos que, quanto maior a alavancagem, menor é a rentabilidade obtida, prejudicando igualmente o múltiplo do equity investido.

Num cenário de taxas de juro mais elevadas, o tempo ganha ainda mais importância. O caso acima apresentado é um bom espelho disso. Conseguir realizar a obra em tempo útil e ter sucesso rápido na revenda do imóvel são pontos fundamentais para o investidor. Caso contrário, terá de refletir o custo acrescido do tempo no preço de venda, correndo o risco de o imóvel ficar fora de mercado.

Bons negócios (imobiliários)!

Leia ainda: Habitação: A importância da Due Diligence num processo de compra

Gonçalo Nascimento Rodrigues é Consultor em Finanças Imobiliárias, tendo trabalhado em empresas como Ernst & Young, Colliers International e Essentia. É Coordenador e Docente numa Pós-Graduação em Investimentos Imobiliários no ISCTE Executive Education. Adicionalmente, exerce atividade de consultoria, prestando serviços de assessoria ao investimento imobiliário. Detém um master em Gestão e Finanças Imobiliárias e um master em Finanças, ambos pelo ISCTE Business School, além de uma licenciatura em Gestão de Empresas na Universidade Católica Portuguesa. É autor do blogue Out of the Box.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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