O trabalho sazonal tem um peso significativo na economia mundial. Principalmente, nos setores da agricultura, hotelaria, turismo e construção civil. Na União Europeia (UE), anualmente, cerca de 850 mil cidadãos deslocam-se para outro Estado-Membro para realizar trabalhos sazonais.
Contudo, a precariedade, a falta de segurança e condições de trabalho, levantam muitas dúvidas sobre os reais direitos dos trabalhadores neste tipo de trabalho.
Assim, para evitar que estes problemas continuem a ocorrer, a Comissão Europeia criou um guia com orientações sobre os direitos dos trabalhadores sazonais na UE, particularmente durante a pandemia da Covid-19.
Por isso, caso esteja a ponderar aceitar um trabalho sazonal, a nível nacional ou na UE, saiba quais são os seus direitos e o que deve ter em consideração antes de tomar uma decisão.
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Trabalho sazonal: em que consiste?
Um trabalho sazonal é um emprego temporário que ocorre em períodos específicos do ano. Por exemplo, os casos mais conhecidos deste tipo de trabalho estão ligados à agricultura, como a apanha de certas frutas, vindimas, etc.
Porém, o trabalho sazonal vai muito além da agricultura. Existem outros setores com várias ofertas de emprego sazonal, nomeadamente a hotelaria, turismo, construção civil, entre outros.
Quando se fala de trabalho sazonal, existem três situações concretas que podem estar em causa:
- Os empregos sazonais dentro do próprio país;
- As ofertas de trabalho sazonal móvel, em que os trabalhadores se deslocam para outro país diferente da sua residência habitual para aceitar estes empregos;
- E, por fim, os trabalhos sazonais em que um trabalhador é destacado pela empresa para outro país fora da sua residência habitual.
Iimporta realçar que os direitos e deveres dos trabalhadores podem ser distintos. Afinal, em alguns casos vigora o Código do Trabalho português, noutros os direitos laborais e sociais do país onde vai trabalhar ou até diretrizes e legislações mais específicas. Logo, é fundamental informar-se sobre a sua situação concreta e quais são os direitos no país onde vai exercer a atividade.
Aceitei um trabalho sazonal em Portugal. Vou ter um contrato por escrito?
Se está a pensar aceitar um trabalho sazonal a nível nacional, saiba que o Código do Trabalho prevê algumas regras nestas situações. No entanto, a legislação dos contratos sazonais em Portugal está associada às regras dos contratos de muito curta duração. Este tipo de contrato não está sujeito a forma escrita, podendo ser feito verbalmente.
O que não quer dizer que o empregador não esteja obrigado a comunicar a celebração e o local de trabalho à Segurança Social. Além disso, a entidade é obrigada a cumprir a legislação, convenções coletivas, os direitos dos trabalhadores e aquilo que foi acordado verbalmente.
Os contratos de muito curta duração, previstos no artigo 142.º do CT, visam cobrir as situações onde existe um acréscimo excecional e substancial da atividade de uma empresa. No fundo, destinam-se a trabalhos onde a atividade ou o mercado são irregulares, ou quando não pode ser assegurada uma estrutura permanente.
Os casos mais conhecidos são as atividades sazonais ligadas ao setor agrícola ou do turismo. Contudo, atualmente a lei abrange qualquer atividade que se enquadre neste contexto.
Já a nível de regras, os contratos de muito curta duração não podem ter a duração superior a 35 dias. Contudo, há a possibilidade de terem a duração máxima total de 70 dias de trabalho num ano civil. Mas, caso não sejam cumpridas as regras, o contrato considera-se celebrado pelo prazo de 6 meses.
Tenho trabalho sazonal no estrangeiro. Quais são os meus direitos?
No caso da sua escolha passar por um trabalho sazonal dentro da UE, os seus direitos são iguais aos dos trabalhadores locais desse Estado-Membro. Dado que os direitos laborais e sociais dos cidadãos de qualquer Estado-Membro estão assegurados e descritos, deve informar-se sobre o contexto que vai integrar.
Contudo, independentemente do Estado-Membro, na UE todos os trabalhadores têm direito à remuneração acordada, a um horário de trabalho, períodos de descanso, e a proteção de saúde e segurança no trabalho.
Além destes direitos básicos, as entidades empregadoras têm de assegurar os direitos previstos na legislação e nas convenções coletivas do Estado-Membro de acolhimento.
Por outro lado, em caso de desemprego involuntário, se estiver inscrito no serviço de emprego desse país, tem direito ao estatuto de trabalhador assalariado no Estado-membro de acolhimento, durante o período de 6 meses.
Dada a atual situação pandémica, as entidades empregadoras passam a estar obrigadas a proporcionar condições dignas de segurança e saúde aos trabalhadores sazonais.
Por fim, em conformidade com a Diretiva 2014/54/UE5, os trabalhadores da UE que exercem o direito à livre circulação têm direito a:
- Serem assistidos pelos organismos nacionais do Estado-Membro de acolhimento que estão vocacionados para a promoção da igualdade de tratamento, bem como para o apoio aos trabalhadores da União e membros das suas famílias;
- Apresentar ações junto do tribunal em caso de discriminação por razões de nacionalidade;
- Apoio dos sindicatos e outras entidades em qualquer procedimento judicial e/ou administrativo;
- Proteção em caso de serem vítimas de qualquer crime previsto na legislação.
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Alojamento e alimentação são gratuitos nos trabalhos sazonais em Portugal?
Tudo depende do acordo com a entidade empregadora. Existem empresas que disponibilizam alojamento e alimentação gratuita aos trabalhadores sazonais, mas outras não.
Em Portugal, estão estabelecidas regras legais em termos do alojamento dos trabalhadores sazonais em território nacional, através da Lei n.º 102/2017, de 28 de agosto. No artigo 56.º-D, mais concretamente nos pontos 3 e 4, ficam claras as seguintes situações:
- No caso do alojamento ser fornecido a título oneroso pelo empregador, pode ser exigida uma renda proporcional à remuneração e condições do alojamento. Contudo, esta não pode ser automaticamente deduzida da remuneração do trabalhador e o valor não pode ser superior a 20% da remuneração.
- Se o empregador fornecer alojamento ao trabalhador sazonal, seja este pago ou gratuito, tem que garantir que este obedece às normas de salubridade e segurança em vigor. Além disso, deve haver um contrato escrito ou cláusulas no contrato de trabalho onde estejam descritas as condições de alojamento.
Regras do alojamento nos trabalhos sazonais mudam no estrangeiro?
Se o trabalho sazonal for num Estado-membro da UE, o alojamento e a alimentação nem sempre são gratuitos. Na verdade, a Comissão Europeia recomenda às entidades contratantes que os custos com alojamento, transporte e alimentação devem ser razoáveis e nunca excessivos, tendo em conta a remuneração líquida dos trabalhadores sazonais.
Contudo, a cobrança destes valores, bem como as condições legalmente previstas, podem variar consoante o país e o tipo de contrato de trabalho. No entanto, estes valores não devem descontar-se do salário dos trabalhadores sazonais automaticamente.
Sou natural de um país fora da UE. Os meus direitos e deveres são os mesmos?
Para quem é natural de um país fora da União Europeia, países terceiros, os procedimentos para aceitar um trabalho sazonal na UE são diferentes.
Em primeiro lugar, precisa de um visto de estadia temporária para o trabalho sazonal. Mas,para conseguir este visto, tem de apresentar o contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho válido para exercer a atividade sazonal.
Em termos de direitos e deveres no trabalho, os trabalhadores oriundos de países terceiros devem requisitar à entidade empregadora que lhes seja entregue, num idioma que consigam entender, as condições de trabalho, direitos e deveres.
Todas as condições de trabalho e benefícios atribuídos pelo empregador devem ser iguais aos restantes trabalhadores.
Vou através de uma empresa de trabalho temporário. Sou um trabalhador sazonal destacado?
Sim. Sempre que o trabalho se realiza através de uma empresa de trabalho temporário sediada num Estado-membro, e a atividade é desempenhada noutro Estado-membro, os trabalhadores estão ao abrigo do estatuto de trabalhadores destacados.
Deve informar-se junto da empresa de trabalho temporário sobre todas as condições contratuais, bem como os seus direitos e deveres enquanto trabalhador destacado. Nestas situações, é aconselhável pedir todas as informações antes de se deslocar para o país onde exercerá funções temporariamente.
Onde consultar direitos e deveres dos trabalhadores sazonais em Estados-membros da UE?
Existe uma plataforma, a ELA (European Labour Authority) que permite consultar informações sobre os direitos e obrigações dos trabalhadores sazonais. No entanto, nem sempre é fácil aceder a esta informação.
O primeiro passo é selecionar o país pretendido. Depois, surgem alguns links para os sites oficiais relacionados com emprego nesse país. Atenção, na maioria dos casos a informação não é apenas referente ao trabalho sazonal, e sim à legislação laboral nesses países.
Contudo, existem outros sites que pode consultar, como por exemplo, o Portal da Mobilidade Profissional EURES ou o próprio site da Comissão Europeia.
Problemas com o empregador: A que autoridades posso recorrer?
No caso de um empregador não cumprir com o que ficou acordado, todos os trabalhadores têm direito a apresentar uma queixa formal sobre a entidade empregadora. Em Portugal, as queixas apresentam-se junto da Autoridade para as Condições do Trabalho, ACT.
Já se os problemas ocorrerem com um empregador de outro Estado-membro, então a queixa deve realizar-se junto da Autoridade Europeia do Trabalho, ELA (European Labour Authority).
Por último, se existirem problemas quando está a prestar trabalho sazonal como um trabalhador destacado, deve recorrer numa primeira fase à empresa de trabalho temporário ou à sua entidade empregadora.
Atenção às burlas. Valide o máximo de informação possível
Como referimos, ao longo dos anos têm sido divulgadas casos de burlas e más práticas em trabalhos sazonais. Por isso, antes de aceitar um contrato de trabalho sazonal, deve tentar obter o máximo de informações sobre a entidade empregadora. Valide se esta está legalizada.
Embora não seja obrigatório nos trabalhos sazonais a entrega de um contrato por escrito, deve falar com a entidade e pedir que lhe seja entregue um documento onde constem todas as condições previstas.
Não se esqueça de questionar a entidade sobre o alojamento, transporte e alimentação, de forma a conseguir identificar os custos antecipadamente. Em alguns casos, depois de conhecidos estes valores, o vencimento pode ser muito inferior ao que pretendia.
Por fim, informe-se sobre os procedimentos para a cessação do contrato e ao que pode estar obrigado caso pretenda rescindir.
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A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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