Embora não seja um regime de horário muito comum, a jornada contínua de trabalho é uma realidade vivida por alguns trabalhadores em Portugal, principalmente para aqueles que trabalham na Função Pública. De uma forma resumida, os trabalhadores que beneficiam deste regime têm um período de descanso menor em prol de uma redução no seu horário. No entanto, este tipo de horário não está ao alcance de todos os trabalhadores e apenas pode ser aplicado segundo algumas regras previstas na legislação.
Caso tenha um contrato que prevê a jornada contínua de trabalho, mas não sabe os seus direitos enquanto trabalhador, ou pretenda saber se pode beneficiar deste regime, vamos explicar-lhe o que prevê a legislação. Saiba ainda se pode ter direito a este regime quando trabalha numa empresa privada e que outras soluções existem para ter o seu horário reduzido.
O que é a jornada contínua de trabalho?
A jornada contínua de trabalho é uma das modalidades que existem de horário de trabalho, e está consagrada na Lei Geral do Trabalho das Funções Públicas, mais concretamente no artigo 114.º. No fundo, este regime de horário consiste na prestação ininterrupta do horário, embora esteja consagrado um período de descanso que não pode ser superior a 30 minutos. Ou seja, o trabalhador que beneficie do horário em jornada contínua faz o seu horário seguido em prol de uma redução de horário, mas tem direito a um pequeno período de descanso que não pode ultrapassar a meia hora. No entanto, ao contrário da hora de almoço, o período de descanso na jornada contínua é considerado tempo de trabalho.
Segundo a legislação, a jornada contínua deve sempre ocupar de forma predominante um dos períodos do dia e reduzir o período normal de trabalho diário. Contudo, esta redução de horário nunca pode ser superior a uma hora. Para além disso, a lei é ainda específica quando refere que o tempo máximo para o trabalho seguido neste regime não pode ser superior a 5 horas.
Todos os trabalhadores da Função Pública têm este direito?
Não, nem todos os trabalhadores podem pedir que o seu regime de horário seja em jornada contínua. Este regime de horário pode ser adotado em alguns casos específicos previstos na lei ou em casos excecionais que sejam devidamente fundamentados. As situações específicas que constam na legislação atualmente são:
- O trabalhador que tem filhos até aos 12 anos ou no caso de ter filhos com deficiência ou doenças crónicas. Nestas duas últimas circunstâncias a idade não é um fator de exclusão para pedir a jornada contínua;
- Um trabalhador que tenha procedido à adoção de uma criança. Nesta situação tem os mesmos direitos que qualquer progenitor, como referimos na primeira situação;
- O trabalhador que, substituindo os progenitores, tenha a seu cargo um neto com menos de 12 anos de idade;
- Para além dos progenitores e avós com netos a seu cargo, os tutores ou pessoas que tenham a confiança judicial ou administrativa de um menor também podem pedir a jornada contínua. Da mesma forma, os respetivos cônjuges ou com quem vivam em união de facto têm os mesmos direitos, desde que vivam em comunhão de mesa e habitação com o menor;
- No caso de ser um trabalhador-estudante também pode pedir este regime de horário;
- Existe ainda a possibilidade, caso seja do interesse do trabalhador, pedir a jornada contínua de trabalho em circunstâncias relevantes que o justifiquem. No entanto, para que tal seja possível, o trabalhador deve fundamentar o seu pedido.
- Por último, quando seja do interesse do serviço e exista uma justificação para tal.
Contudo, mesmo que se enquadre numa destas situações previstas na lei, é importante esclarecer que o requerimento não lhe dá o direito garantido à jornada contínua. Para beneficiar deste regime o seu pedido deve ser autorizado pelo superior hierárquico do seu serviço profissional.
O empregador pode definir que o horário do trabalhador passe a ser prestado em jornada contínua?
Pode, mas apenas em prol do serviço e quando for devidamente fundamentado. Ou seja, no caso da Função Pública onde está previsto este regime, a entidade empregadora não pode simplesmente mudar o horário para jornada contínua sem qualquer justificação.
Por norma, este regime apenas é aplicado em determinados postos de trabalho, principalmente quando o serviço é essencial e tem que ser assegurado por uma ou mais pessoas. No entanto, isso não quer dizer que em situações excecionais a entidade empregadora não possa ter que reformular os horários e aplicar, durante um determinado período, a jornada contínua de trabalho.
Existe a possibilidade de jornada contínua de trabalho no setor privado?
Em termos legais, a jornada contínua é um regime de horário que apenas está previsto na Lei Geral do Trabalho das Funções Públicas. Ou seja, esta modalidade não vem referida no Código do Trabalho, por onde se regem as entidades empregadoras privadas. No entanto, isto não quer dizer que não exista a possibilidade de efetuar algumas horas consecutivas de trabalho com a redução do período de descanso.
Segundo o artigo 213.º do CT, caso exista uma regulamentação coletiva de trabalho, a prestação de trabalho pode ser realizada até 6 horas consecutivas. Nestes casos, o intervalo para descanso pode ser reduzido, excluído ou ter uma duração superior à duração normal. O mesmo artigo ainda estabelece a possibilidade de existirem outros intervalos de descanso, caso a regulamentação coletiva de trabalho assim o determine.
Contudo, é importante que saiba que esta é uma possibilidade diferente da jornada contínua, uma vez que só pode ser exercida se houver uma regulamentação coletiva de trabalho. Mas, para os trabalhadores numa empresa privada, existem outros regimes horários que podem permitir que cumpra outro tipo de horários.
Ler mais: Quais as diferenças entre trabalhar no público e no privado?
Caso o meu empregador privado veja com bons olhos uma adaptação, que soluções legais existem?
O Código do Trabalho prevê várias hipóteses para os trabalhadores que pretendem ver o seu horário de trabalho adaptado a outro regime. No entanto, antes de falarmos das opções que existem, deve saber que cada uma delas implica um acordo com a sua entidade empregadora ou por regulamentação coletiva de trabalho, podendo implicar obrigações que não são vantajosas para si.
Por exemplo, caso pretenda ver outras hipóteses para apresentar ao seu empregador deve informar-se sobre o regime de adaptabilidade individual, o horário concentrado, o horário flexível caso tenha filhos menores de 12 anos ou a isenção de horário de trabalho. Cada um destes regimes tem obrigações e direitos específicos, que devem ser consultados e analisados antes de fazer um requerimento à sua entidade empregadora. Por isso, nunca tome este tipo de decisão sem antes consultar a lei, analisar os prós e contras, e refletir se é mesmo a melhor opção para si.
A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
Trabalho numa empresa de venda de combustiveis onde faço jornada continua e não tenho redução no horário nem 30 minutos para me alimentar.
É isto legal?
Devo de fazer alguma coisa?
Olá, Hélder.
Neste caso, sugiro o contacto direto com a Autoridade para as Condições do Trabalho: Poderá fazê-lo através do número 300 069 300.