Para além do vencimento base é frequente as empresas pagarem abonos adicionais aos funcionários, normalmente ligados ao desempenho de funções específicas (como é o caso de subsídios de turno, isenção de horário de trabalho, abono para falhas ou ajudas de custo) ou a práticas mais ou menos estabelecidas (por exemplo prémios de produtividade, participação de lucros ou subsídios de refeição).
Estes abonos adicionais podem ser perfeitamente válidos, mas são também frequentemente utilizados por permitirem, em alguns casos, poupança fiscal ou contributiva para as empresas e/ou para os trabalhadores. De notar que, em geral, por cada euro de vencimento a empresa suporta mais 23,75% para a Segurança Social e o funcionário suporta 11% para a Segurança Social e um montante variável para IRS (a este propósito sugere-se a consulta do simulador de salário líquido do Doutor Finanças).
Em qualquer caso, importa ter presente algumas particularidades, que podem inclusivamente ser importantes numa negociação salarial.
Proteção laboral
Muitos abonos adicionais não garantem ao funcionário a mesma estabilidade remuneratória que o vencimento base, já que, em certos casos, podem ser alterados ou mesmo removidos com base na vontade do empregador ou mudança nas funções, o que pode abanar qualquer orçamento familiar. Um bom exemplo destes casos é a isenção de horário de trabalho, que representa frequentemente 25% do vencimento base e, tipicamente, é suscetível a ser retirado.
Mesmo em caso de cessação do contrato de trabalho o cálculo de eventuais compensações pode não contemplar a totalidade ou parte dos abonos adicionais, o que pode ser uma surpresa desagradável.
Estes temas de proteção e direitos laborais podem ser relativamente complexos, pelo que se uma fatia relevante do seu vencimento for, ou passar a ser, composta por abonos adicionais pode ser relevante contactar um especialista em direito laboral, para que esteja plenamente consciente dos seus direitos e, eventualmente, negociar de uma forma mais informada.
Segurança Social
Alguns abonos adicionais não estão sujeitos a contribuições para a Segurança Social, tanto pela empresa como pelo trabalhador, o que representa um ganho líquido muito significativo, normalmente de 23,75% para a empresa e de 11% para o trabalhador. Dentro deste tipo de abonos de destacar os prémios com carácter extraordinário, participação de lucros, abonos para falhas, ajudas de custo ou o subsídio de refeição (estes três últimos dentro de certos limites), embora existam outros.
Se por um lado a não sujeição a contribuições para Segurança Social é interessante na vertente de aumentar o rendimento mensal líquido, por outro tais abonos deixam de ser considerados para efeitos da carreira contributiva. Esta situação tem impactos a longo prazo, já que estes abonos não serão considerados para eventuais prestações sociais, incluindo baixas médicas, licenças de paternidade ou reforma, reduzindo o valor a receber.
IRS
No que respeita ao IRS, existe um número mais reduzido de situações de não sujeição, habitualmente relacionados com questões sociais ou possíveis encargos da função exercida pelo funcionário. Ao contrário do que acontece para a Segurança Social, a generalidade dos prémios pagos está sujeita a IRS, mesmo tendo carácter extraordinário.
Por regra, os abonos não sujeitos a IRS não estarão também sujeitos a Segurança Social, mas o inverso é menos frequente. Assim, nos casos em que existe não sujeição a IRS o funcionário ganha duplamente, no IRS e na Segurança Social.
Entre os abonos não sujeitos a IRS incluem-se os cheques creche, ajudas de custo, reembolso de quilómetros, subsídio de refeição ou abonos para falhas, todos dentro de certos limites, excepto o primeiro.
Também de referir que no caso das horas extra (trabalho suplementar), integralmente sujeitas a IRS, a taxa de retenção aplicável será a dos restantes rendimentos de trabalho dependente, podendo ser zero para vencimentos mais baixos. Deste modo, esse efeito terá de ser “corrigido” na declaração anual de IRS, resultando num valor mais baixo a receber ou mais alto a pagar, algo a ter em conta na gestão do orçamento familiar, especialmente quando as horas extra forem uma fatia elevada do vencimento.
Abonos adicionais: vantajosos mas com alguns pontos negativos
Naturalmente é sempre positivo para o funcionário receber um maior vencimento, seja qual for a natureza desse acréscimo remuneratório. Contudo, como vimos, o nível de proteção laboral pode não ser equivalente ao do vencimento base, o que deve ser tido em conta no orçamento familiar. Se a não sujeição em sede de IRS não traz especial desvantagem, já ao nível da Segurança Social a carreira contributiva não é aumentada, prejudicando futuras prestações sociais a receber.
Por último, importa também referir que na análise bancária para efeitos de crédito, incluindo crédito à habitação, os abonos adicionais têm habitualmente um peso menor do que o vencimento base, pelo que, em algumas situações podem inviabilizar a aprovação do financiamento.
O Pedro Pais desenvolve conteúdos sobre finanças pessoais há vários anos, tendo fundado um dos primeiros blogs nacionais sobre o tema, o Pedro e o Blog, mais tarde financaspessoais.pt, e o Fórum Finanças Pessoais, que se tornaram bastante conhecido e fazem hoje parte integrante do Doutor Finanças. É Revisor Oficial de Contas desde 2015 e sócio da GPA SROC, onde coordena trabalhos de auditoria, assessoria fiscal e consultoria. Quando não está a trabalhar ou a estudar, o Pedro gosta de se dedicar à família, amigos e jogar Padel.
A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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3 comentários em “Remuneração fora do vencimento base: pontos positivos e negativos”