Os assaltos à carteira nem sempre vêm encapuzados e nem se antecedem pela mítica frase: “isto é um assalto”. Muito pelo contrário! A maior parte das vezes vimo-nos em situações em que fomos nós próprios a assinar por baixo para que terceiros fiquem com o nosso dinheiro. A estas situações damos os nomes de burlas e fraudes.
A verdade é que, muitas vezes, estes esquemas são tão bem pensados e desenvolvidos, que é simples cairmos neles. Por isso, é essencial estar bem informado sobre o modo de atuação destas entidades, de forma a evitar ser mais uma vítima deste tipo de crime.
O ponto de partida trata-se de perceber se, a entidade ao qual está a recorrer, trata-se mesmo de uma instituição ou intermediário de crédito reconhecido pelo Banco de Portugal.
O que é um intermediário de crédito?
Podem desempenhar a atividade de intermediário de crédito, tanto as pessoas singulares quanto as coletivas, no entanto, é preciso ter autorização e registo junto ao Banco de Portugal.
Este funciona como um mediador entre o consumidor e a instituição financeira e, portanto, está habilitado para:
- Apresentar ou propor contratos de crédito;
- Prestar assistência nos atos preparatórios do procedimento;
- Celebrar contratos de crédito em nome das instituições financeiras;
- Prestar serviços de consultoria, através da emissão de recomendações personalizadas sobre contratos de crédito.
O intermediário de crédito não está autorizado a conceder crédito, nem a intervir na comercialização de outros produtos ou serviços bancários, como, por exemplo, depósitos a prazo ou serviços de pagamento.
Apenas os intermediários de crédito podem utilizar as expressões como “intermediário de crédito”, “mediador de crédito”, “agente de crédito” ou equivalentes na sua firma ou denominação.
Leia ainda: Instituições intermediárias de crédito: confira se é autorizada
Como identificar um intermediário de crédito autorizado?
Primeiro do que tudo, e antes de solicitar qualquer serviço, deve confirmar se a empresa exerce atividade de intermediário, através do Portal do Cliente Bancário. Os intermediários de crédito autorizados a exercer atividade em Portugal constam de duas listas publicadas pelo Banco de Portugal:
- A lista de entidades habilitadas a atuar como intermediários de crédito;
- A lista de instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento e instituições de moeda eletrónica que prestam serviços de intermediação de crédito ou de consultoria relativamente a contratos de crédito em que não atuem como mutuantes.
Existem também outros fatores que deve estar atento e analisar se sucedem, e são eles:
- A cobrança do processo de avaliação - é muito recorrente que, algumas das instituições ditas fraudulentas, cobrem para fazer a avaliação da situação do cliente. Se isto acontecer desconfie, uma vez que, por lei, não é permitido cobrar qualquer tipo de valor na fase de avaliação.
- Os contactos da instituição - o mundo digital veio aumentar o tipo de abordagens possíveis que podem ser feitas ao cliente, seja por email ou SMS, por exemplo. Por isso, deve pesquisar os contactos num motor de busca, por exemplo, para verificar se esses pertencem, ou não, à entidade oficial.
- A falta de informação sobre a entidade - procure informações sobre a idoneidade da empresa mediadora de crédito e procure testemunhos de clientes insatisfeitos, seja na imprensa ou em notícias na internet. Pode também verifique as reclamações em sites confiáveis do tipo “Portal da Queixa” ou simulares, porque partilham experiências e informações em matéria de consumo. Deve também estar atento a burlas com créditos na internet.
- O tipo de comunicação - é importante estar atento aos pequenos detalhes, como o tipo de escrita que é utilizada, se existem erros ortográficos ou gramaticais, e ainda incoerências. Desconfie de anúncios com a linguagem de «dinheiro fácil» «sem burocracias» etc, confirme se a entidade está devidamente autorizada.
- O pedido dos dados bancários - em caso de dúvida, e até confirmar a credibilidade da instituição, não forneça nenhum dado pessoal ou bancário.
Como é o modo de atuação das entidades fraudulentas?
Estas entidades dizem conceder crédito, rapidamente, sem formalidades complexas, com discrição, a todas as pessoas, mesmo àquelas que não conseguem obter crédito junto do sistema financeiro.
Segundo o Banco de Portugal, é muito comum que proponham a concessão de crédito a quem os procura, exigindo, como contrapartida, a entrega de cheques pré-datados ou a propriedade de bens imóveis ou bens móveis, tais como veículos automóveis.
De entre as particularidades destas propostas, destacam-se, tipicamente:
- A publicitação de ofertas de concessão de crédito a quem necessita com urgência de “liquidez”, através da internet, designadamente nas redes sociais, ou através da publicitação de ofertas de concessão de crédito em anúncios publicados em jornais de grande tiragem nacional;
- Algumas vezes, estas ofertas de crédito não são feitas diretamente pela pessoa que concede o empréstimo, surgindo uma entidade intermediária que, após alegadamente procurar soluções de crédito junto do sistema financeiro, informa o cliente dessa impossibilidade em face da sua taxa de endividamento e sugere-lhe a proposta alternativa de financiamento junto de “particulares”;
- A oferta é apresentada ao cliente como uma proposta séria, simples e dentro dos parâmetros da legalidade, assumindo muitas vezes o intermediário a preparação da documentação necessária à concretização do negócio e a sua condução;
- No caso da concessão de crédito por contrapartida de imóveis, é prometida liquidez imediata, desde que o cliente transmita a propriedade do imóvel para a entidade que vai conceder o crédito – em ato presencial de escritura pública ou após a emissão de uma procuração que dispense a sua presença. É transmitido ao cliente que poderá continuar a habitar o imóvel em causa (muitas vezes, na qualidade de arrendatário) e manter a opção de recompra do mesmo após o pagamento do financiamento concedido e juros, no prazo previsto;
- Esta opção de recompra do imóvel consta, muitas vezes, no contrato de arrendamento entretanto celebrado, ou em contrato promessa de compra e venda. Em caso de incumprimento das prestações mensais a que o cliente se obriga – muitas vezes sem possibilidade financeira de as cumprir –, a opção de recompra extingue-se e o cliente não tem direito a recuperar ou a utilizar o imóvel;
- No caso da concessão de crédito por troca de cheques, os clientes são informados de que estas operações se destinam a pessoas que necessitam de resolver problemas de liquidez urgente, que os cheques são passados com datas futuras, sendo que, de acordo com o que é publicitado, estes cheques só podem ser levantados nas respetivas datas de pagamento. Sucede que, na maioria das vezes, estas entidades mutuantes procedem ao levantamento, em bloco, dos cheques entregues pelos clientes, antes da data prevista. Caso a conta bancária não esteja aprovisionada, o cliente fica em situação de incumprimento perante o banco do qual são sacados os cheques entregues para pagamento e fica na obrigação de pagar comissões associadas ao saldo a descoberto;
- Muitas vezes, estas concessões de crédito envolvem a subscrição, por parte dos clientes, de uma confissão de dívida, cujo valor incorpora não só o valor do capital mutuado, mas também o montante de juros a ser pago em cada operação deste tipo. Em consequência, o cliente nunca recebe a totalidade do valor inscrito na referida confissão de dívida e tem dificuldades em entender qual a taxa de juro aplicável ao crédito que solicitou;
- A inexistência de um estabelecimento fixo por parte de quem concede o crédito, o que torna extremamente difícil o subsequente contacto pelos clientes.
A pandemia levou ao aumento das burlas de crédito
Segundo o Diário de Notícias, no primeiro trimestre de 2020 houve um aumento de 34% das denúncias registadas no Portal da Queixa. Muitas destas denúncias envolvem burlas com o MBWAY ou esquemas fraudulentos em nome de entidades bem conhecidas.
No entanto, durante a pandemia do covid-19, a PSP registou um aumento de 131% de burlas com fraude bancária. Uma vez que vivemos tempos de crise económica - em que muitas famílias e empresas sentiram cortes severos nos seus rendimentos, existe um aumento significativo da taxa de desemprego e de empresas a decretarem falência - são muitos aqueles que se aproveitam para passar por intermediários de crédito, com o objetivo de obter (o seu) dinheiro.
Outro fator que levou a que este número aumentasse durante a pandemia foi o facto de praticamente todos os serviços presenciais estarem fechados e o meio online ganhar força. Isto é, como não era possível a deslocação aos espaços físicos, os portugueses recorreram mais à contratação de serviços online, não conseguindo, muitas vezes, perceber que estavam a ser vítimas de uma fraude.
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Em caso de dúvida ou crime comunique ao Banco de Portugal
Se foi vítima de algum crime ou tentativa de crime por parte de uma destas entidades, denuncie ao Banco de Portugal por telefone (213 130 000), e-mail (info@bportugal.pt) ou pelo preenchimento do formulário online ou presencialmente. Apresente também queixa às autoridades (por exemplo, à PSP, à GNR, à Polícia Judiciária ou ao Ministério Público). À entidade supervisora cabe comunicar a existência de indícios de crime (burla, usura ou outro) à Procuradoria-Geral da República.
Mesmo que não tenha sido vítima de crime, se tomou conhecimento de que uma determinada entidade se dedica a atividades financeiras ilegais, não deixe de reportar essa situação ao Banco de Portugal.
A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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