Comprar ações de empresas cotadas em bolsa é um dos investimentos de maior risco que pode enfrentar nos mercados.
A probabilidade de perder dinheiro não é baixa. Mas é também dos que apresenta um retorno potencial mais elevado, pelo que aplicar parte das suas poupanças no mercado acionista deve ser sempre uma opção a considerar, sobretudo se não é um investidor conservador.
Até porque existem diversas formas de reduzir o risco do investimento em ações. A principal passa por investir numa ótica de longo prazo. Os dados históricos mostram que num investimento com um horizonte temporal de vários anos, a probabilidade de obter retornos atrativos é elevada.
Outra forma de baixar o risco do seu investimento passa por apostar em ações de empresas que pagam bons dividendos. São duas as vantagens mais evidentes:
- Vai receber uma remuneração periódica enquanto mantiver as ações na sua carteira (habitualmente uma vez por ano);
- As ações que pagam os melhores dividendos são habitualmente mais defensivas e com negócios mais previsíveis, sendo por isso, também menos voláteis (e por isso menos arriscadas).
É na importância dos dividendos como estratégia de investir em bolsa que vamos focar neste artigo, explicando os principais indicadores relacionados com a remuneração das empresas aos acionistas e descrevendo o que tem de saber para escolher os melhores dividendos.
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O que tem de saber sobre dividendos
Antes de pensar em que empresas pode investir para receber bons dividendos, tem perceber quais os indicadores mais relevantes. Selecionámos seis, sendo que vários são conhecidos no termo em inglês, uma prática difícil de escapar no mundo dos mercados.
Dividendo por ação
Corresponde à parcela dos resultados líquidos que uma empresa decide distribuir pelos seus acionistas, dividido pelo número de ações que constituem o capital social. Habitualmente é pago uma vez por ano (várias companhias também pagam trimestralmente), depois de o valor ser aprovado em assembleia geral de acionistas e refere-se ao exercício anterior. Por exemplo, na bolsa portuguesa as cotadas estão neste mês de maio a remunerar os acionistas devido aos resultados de 2021.
As empresas destinam um valor total para distribuir pelos acionistas, mas o dividendo por ação (DPA ) é o mais relevante para o investidor, pois permite calcular quando vai ganhar (tem de multiplicar o DPA pelo número de ações em carteira).
Além deste dividendo, que resulta dos lucros obtidos (conhecido por regular, ou ordinário), muitas empresas também pagam dividendos extraordinários em função de eventos específicos.
São vários os pretextos, como o encaixe de somas avultadas com venda de ativos, ou a acumulação de reservas consideradas excessivas. O dividendo é habitualmente pago em dinheiro, mas há casos em que as cotadas (devido à escassez de liquidez disponível) optam pelo chamado dividend script, em que o acionista recebe x ações por cada y que já detenha.
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Dividend yield
É o indicador mais relevante (mas não o único) para o qual tem de olhar para avaliar a atratividade de um dividendo. Este rácio é calculado através da divisão do valor do dividendo por ação (DPA) pela cotação da ação e mostra-nos qual é a rendibilidade do dividendo (a rendibilidade do investimento é determinado também pela variação da cotação).
Por exemplo, se uma empresa que está a negociar em bolsa com uma cotação de 100 euros e pagar um DPA de 5 euros, o dividend yield é de 5%. Não há números mágicos que nos digam a partir de que yield o dividendo é considerado atrativo. Depende, sobretudo, da expectativa do investidor e a maior utilidade passa por comparar com alternativas, quer sejam ações ou outros ativos.
Se duas ações têm dividendos com rendibilidades semelhantes, deve optar pela que apresenta a volatilidade mais reduzida, pois o risco é mais baixo. A yield do dividendo também deve ser comparada com a rendibilidade de outros ativos, como as obrigações, para avaliar se compensa o risco que está a assumir.
Atualmente, as obrigações apresentam rendibilidades muito reduzidas, devido ao facto de as taxas de juro estarem ainda muito baixas, o que reforça a atratividade dos dividendos. Note, contudo, que o nível de risco das ações é muito superior ao das obrigações.
Em relação ao dividend yield, é importante olhar para o rácio com base nos dividendos já pagos (ou anunciados/aprovados), mas também para as estimativas dos analistas para a evolução deste indicador no futuro. Dá-nos uma ideia sobre a expectativa de rendibilidade do dividendo e evolução dos resultados da companhia.
É importante também alertar para a armadilha que pode ser olhar apenas para o dividend yield de forma isolada. Pode ser elevado apenas porque a cotação da empresa está deprimida devido a uma série de outros fatores, não sendo nesse caso aconselhável o investimento.
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Payout
É provavelmente o segundo rácio mais importante na análise dos dividendos. É calculado através da divisão da remuneração total aos acionistas, pelos resultados líquidos no exercício.
Uma cotada que distribua 70 milhões de euros aos acionistas depois de ter terminado o ano com um lucro de 100 milhões de euros, apresenta um payout de 70%.
Avaliar se o payout é alto ou baixo depende sempre da atividade da empresa, do setor que integra, dos indicadores que apresenta (dívida, cash flow) e do histórico. Mas os analistas advertem que rácios acima de 100% (empresa distribuir em dividendos uma soma superior aos lucros obtidos) pode não ser sustentável, sobretudo se acontecer de forma recorrente. Indica que a empresa poderá ter de endividar-se para remunerar os acionistas.
Por outro lado, payouts reduzidos (muito abaixo de 50%) também podem ser justificados, caso a empresa esteja num ciclo de investimentos e encontra oportunidades mais rentáveis para os acionistas do que lhes devolver uma grande fatia dos lucros.
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Política de remuneração
Se pretende investir numa empresa que seja boa pagadora de dividendos, importa que avalie o histórico e qual é o compromisso da cotada na remuneração dos acionistas.
Muitas cotadas têm uma política bem definida, que pode passar por várias métricas. Algumas definem um DPA mínimo no futuro e outras estabelecem metas de crescimento.
Várias empresas preferem políticas que têm por base rácios e indicadores, como o payout ou a relação entre a dívida e o EBITDA, para que os dividendos estejam relacionados com a evolução da atividade. Para não ser surpreendido, é sempre preferível escolher cotadas que têm a sua política de remuneração bem definida.
Baixar o risco deve ser sempre um dos objetivos dos investimentos e reduzir a incerteza com as remunerações futuras é uma forma de assumir menos riscos. Por exemplo, se a cotada x aumentou os dividendos de forma regular nos últimos cinco anos e promete fazer o mesmo nos próximos, a probabilidade de cumprir é mais elevada face a uma empresa com um histórico irregular e uma política de remuneração pouco clara.
Dívida/EBITDA
Este rácio não está diretamente relacionado com o dividendo, mas é fundamental para analisar se os dividendos que uma empresa paga são sustentáveis.
O rácio é calculado através da divisão da dívida líquida pelo EBITDA (lucros antes de juros, impostos, amortizações e depreciações). Na prática, diz-nos quantos anos uma empresa necessita para pagar toda a dívida através do lucro gerado com a sua atividade operacional.
Também neste indicador não existe um número ideal, sendo sempre dependente da atividade da empresa e do setor em que se encontra. É importante sobretudo para comparar com outras cotadas. Se a rendibilidade do dividendo for semelhante entre duas empresas, à partida fará sentido optar pela que tem o rácio dívida/EBITDA mais reduzido, pois indica que está menos endividada. E, por isso, com maior potencial para pagar dividendos mais elevados no futuro.
Ex-dividendo
Depois do ser anunciado pela administração da empresa, e aprovado pelos acionistas em assembleia geral, é comunicada uma data em que a remuneração será colocada na conta de quem detém as ações.
Contudo, a data mais importante é aquela em que a ação desconta o valor do dividendo, que é conhecida por ex-dividendo. Por exemplo, se uma empresa paga o dividendo no dia 18 de maio, entra em ex-dividendo no dia 16 de maio (sempre duas sessões antes, no caso da bolsa de Lisboa).
Um investidor que detenha ações desta cotada até ao fecho da sessão de 15 de maio, vai receber dividendos a 18 de maio. Mas se comprar a 16 de maio já não receberá a remuneração. É por isso que nesse dia do ex-dividendo a cotação da ação ajusta o valor da remuneração.
Muitos investidores optam por comprar ações uns dias antes do pagamento para embolsar a remuneração, vendendo os títulos no dia do ex-dividendo, visando que o ajuste da cotação seja inferior ao valor do dividendo. É uma estratégia especulativa de muito curto prazo e por isso nada aconselhável a investidores não profissionais.
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Como escolher os melhores dividendos
Já explicámos os principais termos sobre o pagamento de dividendos, com algumas das dicas nesta estratégia de investimentos. Mas há mais informação genérica que tem de ter em conta quando está a escolher as empresas com dividendos mais atrativos. Desde logo nunca olhar apenas para o dividendo (e os vários indicadores relacionados) para selecionar a ação (ou ações) em que vai investir.
Na análise de um investimento devem ser tidos em conta uma série de fatores. Se está à procura de empresas com bons dividendos, a remuneração deve ter uma preponderância relevante na decisão, mas não pode ser a única.
O momento da empresa, do setor em que se encontra, da economia onde se insere e uma outra série de fatores específicos e genéricos devem ser analisados na altura de escolher o melhor investimento.
O momento do investimento também deve ser tido em conta, pois apesar do objetivo ser de longo prazo, comprar a ação num mau timing pode colocar em causa o retorno. Os mercados acionistas registam um desempenho negativo em 2022, pressionados pela elevada incerteza em resultado dos efeitos da guerra na Ucrânia, forte subida da inflação e perspetivas de agravamento agressivo das taxas de juro por parte dos bancos centrais.
No que ao dividendo diz respeito, e sobretudo se está a investir na lógica do longo prazo, é importante que seja avaliada a sustentabilidade, sendo por isso relevante que se olhe para o payout, indicadores financeiros da empresa e histórico de pagamento.
É também fundamental avaliar as perspetivas de evolução dos resultados e os compromissos assumidos pelas cotadas na remuneração aos detentores de ações.
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Escolher pelo dividend yield ou payout?
Dar um exemplo ajuda a mostrar como é importante olhar para vários indicadores na altura de selecionar os melhores dividendos. Entre as 17 cotadas portuguesas que remuneram os acionistas este ano, a Novabase apresenta o segundo dividend yield mais elevado (8,8%), bem acima da rendibilidade do dividendo da REN (5,2%). Tendo com conta apenas esta informação, a escolha da Novabase seria óbvia.
Contudo, a tecnológica não pagou dividendos nos últimos dois anos e a empresa vai distribuir aos acionistas um valor bem superior aos lucros obtidos no ano passado (payout de 155%). A REN reduziu o dividendo depois de uma série de anos sempre a pagar a mesma remuneração. Mas o corte não apanhou os investidores desprevenidos, pois a empresa anunciou uma nova política de remuneração que implica um valor mínimo e um payout inferior a 100%.
Acresce que a REN está presente numa área de negócio bem mais estável, com resultados mais previsíveis e garantidos, que tornam mais provável a manutenção de um dividendo atrativo. A empresa que gere as redes energéticas em Portugal é muitas vezes comparada a uma obrigação, dado ser uma ação de baixo risco que oferece retornos anuais atrativos através do pagamento de dividendos.
A Novabase está presente numa área de negócio com maior potencial de crescimento, mas a irregularidade é uma ameaça à sustentabilidade do dividendo. Quem procura uma ação com a perspetiva de receber bons dividendos nos próximos anos, a REN parece a escolha mais acertada.
Este exemplo não tem como propósito qualquer tipo de recomendação, visando apenas ilustrar como uma análise cuidadosa e abrangente é essencial para encontrar os melhores investimentos que vão ao encontro dos seus objetivos.
As empresas portuguesas são consideradas boas pagadoras (mais de metade com dividend yield acima de 4%), mas há dividendos ainda mais atrativos nas bolsas de outros países.
Se não tiver disponibilidade/interesse/conhecimento para escolher as ações com melhores dividendos, tem outras alternativas para investir nesta estratégia. Existem diversos fundos de investimento especializados em dividendos, que podem ser uma boa opção. Mas, neste caso, não receberá diretamente a remuneração, ao contrário do que acontece com o investimento direto em ações.
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Nasceu em 1977, sendo jornalista desde 1999. Iniciou a carreira no Jornal de Negócios, onde esteve mais de 20 anos, ocupando várias funções, sempre com foco no online. Atualmente é jornalista independente, assina a newsletter diária de mercados Morning Call e colabora de forma regular com o ECO. Formado em Gestão no ISEG, tem especial interesse por tudo o que está relacionado com os mercados financeiros.
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