Em condições normais a redução salarial de um ou mais trabalhadores não é legal. Ainda assim, há situações em que tal é possível se forem cumpridas determinadas regras. Por exemplo, quando acontecem crises económicas.
Ou seja, só pode ter um corte no salário se houver justificação e um acordo de ambas as partes: entidade patronal e trabalhador. Mas existem algumas exceções à regra.
Redução salarial: o que diz a lei?
O Código do Trabalho (Lei n.º 7/2009) determina, no artigo 129.º, que o empregador está proibido de “diminuir a retribuição” do trabalhador, “salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho”.
O Código do Trabalho prevê situações em que é possível uma redução do salário, nomeadamente quando o trabalhador muda para uma categoria inferior, passa de um full-time para um part-time ou quando a empresa atravessa uma situação de crise empresarial e avança para o regime de lay-off.
Situações em que pode haver uma redução salarial
Conforme já referido, lei permite que haja uma redução salarial dentro de determinadas condições. Assim, os casos em que tal é possível são a exceção e não a regra. É isso que vamos explicar em seguida.
Redução do trabalho ou suspensão de contrato de trabalho (lay-off)
Este regime de trabalho diferencia-se do regime intermitente pela sua natureza de exceção face a circunstâncias singulares.
Por outro lado, esta modalidade que se destacou durante a pandemia, pode traduzir-se em duas formas:
- uma redução temporária dos períodos normais de trabalho;
- ou uma suspensão do contrato de trabalho.
Nesse sentido, há atividades que estão mais expostas, como por exemplo a restauração ou hotelaria.
Este regime é legal sempre que “seja indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de trabalho”. Neste caso, o trabalhador continua a receber salário, mas com uma redução.
O montante a receber será o valor mais elevado entre:
- um valor mínimo igual a dois terços da retribuição normal ilíquida, ou seja, sem descontos;
- ou o valor da retribuição mínima mensal garantida (760 euros em 2023), correspondente ao período normal de trabalho.
Durante o período em que se encontra em lay-off, o trabalhador pode ter outra atividade remunerada. No entanto, o valor total da sua retribuição mensal não pode ser superior a três vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida (2280 euros em 2023).
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Regime de trabalho intermitente
As empresas que tenham períodos de menor trabalho ou até mesmo de inatividade, como por exemplo na hotelaria, podem implementar uma redução salarial no trabalhador.
Isto porque, a prestação de trabalho é descontínua ou com intensidade variável. Nesta situação, o trabalhador tem direito a receber:
- pelo menos, 20% da retribuição base;
- ou, em alternativa, um valor que tenha sido estabelecido por regulamentação coletiva de trabalho.
Mudança para uma categoria inferior
A redução salarial também pode ocorrer se um trabalhador mudar para uma categoria inferior. Esta situação pode acontecer por iniciativa do trabalhador ou da empresa mas implica sempre a existência de um acordo entre trabalhador e empregador.
Além disso, terá de ser autorizada pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT). Isto mesmo nos diz o artigo 119.º da lei nº 7 do Código do Trabalho.
Regresso à função anterior após fim de comissão de serviço
Há situações em que o trabalhador pode ter uma função em regime de comissão de serviço. Por exemplo, cargos de administração, chefias, direção-geral ou equivalente que, regra geral, implicam um salário mais elevado.
No entanto, quando acaba a comissão de serviço e o trabalhador regressa à sua categoria profissional anterior, a lei permite uma redução salarial. Neste caso, dado que o trabalhador apenas mudou de funções temporariamente, a correspondente alteração no seu salário é circunstancial e dentro da lei.
Mudar de regime de trabalho a tempo completo para tempo parcial
Quando um trabalhador que estava em regime de tempo inteiro passa para um part-time, pode ter uma redução do salário na proporção da diminuição do horário de trabalho.
Assim, esta mudança pode ocorrer desde que haja igualmente um acordo entre o trabalhador e a empresa. Por exemplo:
- caso o trabalhador tenha filhos menores de 12 anos;
- ou quando os seus filhos, seja qual for a idade, sejam portadores de deficiência ou tenham uma doença crónica.
Penhoras de salário
Se tiver dívidas ao Fisco, à SS ou a outras entidades, e estas forem exigidas por lei ou por uma decisão judicial, pode ser alvo de uma penhora de salário. Neste caso, uma parte do seu salário será automaticamente destinada ao pagamento destas dívidas. Ou seja, terá obrigatoriamente uma redução salarial todos os meses até saldar os valores em dívida.
Por exemplo, no caso de pensões de alimentos a ex-cônjuges ou aos filhos, o empregador recebe uma notificação para penhorar o salário.
A perda salarial pode ser de um terço da retribuição, mas o trabalhador não pode receber, por mês, menos do que o salário mínimo nacional (760 euros a partir de janeiro de 2023). A penhora pode ser maior, se ficar garantido que lhe é entregue, pelo menos, o triplo do salário mínimo (2280 euros a partir de janeiro de 2023).
Indemnizações a pagar pelo trabalhador
Pode haver situações em que o trabalhador tenha de pagar indemnizações à entidade patronal. Neste caso a redução salarial é válida desde que seja reconhecida pelos tribunais.
Sanções pecuniárias aplicadas ao trabalhador
Quando o trabalhador comete alguma infração disciplinar, além de uma repreensão por parte do empregador, pode igualmente sofrer um corte no seu salário. De acordo com a lei, o trabalhador corre o risco de:
- perda de dias de férias;
- suspensão com perda de salário e despedimento;
- e ainda a aplicação de uma “multa”.
Leia ainda: Licença sem vencimento: O que é e em que condições pode pedir?
Outras situações em que pode haver redução salarial sem acordo do trabalhador
Na realidade existem ainda outras situações em que o empregador pode reduzir o salário sem o seu acordo. São elas:
- Amortizações e juros de empréstimos dados pelo empregador;
- Pagamento antecipado de parte ou da totalidade do salário;
- Despesas pagas pelo empregador com acordo e a pedido do trabalhador (valores relativos a refeições no local de trabalho, a uso de telefones, entre outras despesas).
Nestes casos, a compensação é feita por via do vencimento.
E se existirem abusos por parte do empregador?
O trabalhador deve tomar as medidas adequadas sempre que sentir algum tipo de abuso por parte da sua entidade patronal. São elas:
Teve uma redução salarial? Contate de imediato a ACT
Caso tenha alguma dúvida ou verifique que os seus direitos não estão a ser respeitados, a primeira coisa que deve fazer é contatar a ACT. Esta entidade pode verificar e corrigir qualquer ilegalidade praticada pelo seu empregador, e se for preciso, aplicar uma coima.
A ACT é a entidade responsável por receber denúncias de situações em que os direitos dos trabalhadores não são respeitados e por inspecionar as condições laborais e o cumprimento das regras.
Por exemplo, se foi alvo de uma redução salarial e a mesma não cumpre com todas as condições legais acima indicadas, pode apresentar queixa e esclarecer qualquer dúvida junto desta entidade.
Fazer um acordo com a entidade patronal
Outra possibilidade é fazer um acordo com a entidade patronal, se ainda acreditar que tal é possível.
Recorrer aos Tribunais
Na verdade, recorrer aos tribunais é outra hipótese mas que deve evitar, não só pelas burocracias e tempo que demora como pelos custos que implica. Se não houver outra alternativa, deve fazê-lo para que estes decidam se a redução salarial é legal ou não.
Rescindir o contrato com justa causa
O trabalhador tem ainda outra possibilidade: rescindir o contrato com justa causa. Ainda assim, informe-se bem se o pode fazer. Isto porque, precisa de provar que a empresa teve um comportamento de tal modo grave que tornou impossível a manutenção da ligação laboral existente.
Se a razão estiver do seu lado, então tem direito a receber uma indemnização entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade (proporcional para ano incompleto). A indemnização nunca poderá ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
Note que, os tribunais podem confirmar a ilegalidade da redução do seu salário mas entenderem que esta não impede a continuidade do contrato de trabalho. Em outras palavras, o tribunal pode entender que existem outras formas do trabalhador contornar a situação sem chegar a esta situação limite da resolução do contrato.
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A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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