Se auferir rendimentos sobre os quais não incide IRS, isso não significa, necessariamente, que esteja dispensado de entregar a declaração anual de rendimentos (Modelo 3). Se estiver dispensado da entrega da declaração não significa que não a possa entregar. Vamos por partes:
Rendimentos não sujeitos a IRS
Os rendimentos não sujeitos a IRS, a designada “Delimitação Negativa de Incidência”, estão previstos no art. 12.º do Código do IRS (CIRS):
- Indemnizações devidas em consequência de lesão corporal, doença ou morte, incluindo as pensões e indemnizações auferidas em resultado do cumprimento do serviço militar, pagas pelo Estado, associações mutualistas, ao abrigo de contrato de seguro, decisão judicial ou acordo homologado judicialmente;
- Prémios literários, artísticos ou científicos, quando não envolvam a cedência, temporária ou definitiva, dos respetivos direitos de autor, desde que atribuídos em concurso com anúncio público;
- Rendimentos de profissionais de espetáculos ou desportistas quando esses rendimentos sejam obtidos em Portugal e tributados em IRC (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas);
- Subsídios para manutenção e cobertura de despesas extraordinárias de saúde e educação, pagos ou atribuídos pelos centros regionais de segurança social e pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa ou IPSS em articulação com aqueles, no âmbito de acolhimento familiar e apoio a idosos, pessoas com deficiências, crianças e jovens;
- Bolsas para desportistas, nas seguintes condições:
- Bolsas atribuídas aos praticantes de alto rendimento desportivo, e respetivos treinadores, pelo Comité Olímpico de Portugal ou pelo Comité Paralímpico de Portugal, no âmbito da preparação para os Jogos Olímpicos, Paralímpicos ou Surdolímpicos, ou pela respetiva federação.
- Bolsas de formação desportiva atribuídas pela respetiva federação a praticantes, juízes e árbitros não profissionais, até ao montante máximo anual de 2.375 €, bem como, compensações atribuídas pelas federações pelo desempenho não profissional de juízes e árbitros, com o mesmo limite anual;
- Prémios em reconhecimento do valor e mérito de êxitos desportivos;
- Incrementos patrimoniais (mais-valias) provenientes de transmissões gratuitas (como heranças, doações) sujeitas ao Imposto do Selo;
- Compensações e subsídios a bombeiros pela atividade voluntária no âmbito do dispositivo especial de combate a incêndios florestais e do dispositivo conjunto de proteção e socorro na Serra da Estrela;
- Rendimentos auferidos por estudante dependente, da categoria A (trabalho dependente) e categoria B (rendimentos profissionais), incluindo atos isolados, até ao limite anual global de 5 vezes o valor do IAS (5 x 509,26 euros em 2024), desde que se encontre a frequentar estabelecimento de ensino. Para o efeito, deve ser submetido, via Portal das Finanças, comprovativo da frequência de estabelecimento de ensino oficial ou autorizado até 15 de fevereiro do ano seguinte àquele a que o imposto respeita;
- Rendimentos obtidos com a produção de energia a partir de fontes renováveis, até ao limite de 1.000 euros, nas seguintes condições:
- Transação da energia excedente produzida para autoconsumo por unidades até ao limite de 1 MW da respetiva potência instalada;
- Transação da energia produzida em unidades de pequena produção até ao limite de 1 MW da respetiva potência instalada.
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Se auferir rendimentos não sujeitos a IRS está dispensado de entregar a declaração de IRS?
A resposta é: depende.
Se apenas tiver auferido rendimentos não sujeitos a IRS, previstos no artigo 12.º do CIRS, está dispensado de entregar a declaração anual Modelo 3.
Se tiver auferido rendimentos não sujeitos e rendimentos sujeitos a IRS como, por exemplo, rendimentos do trabalho dependente, pensões, rendimentos profissionais, rendimentos prediais, etc., pode ser obrigado a declará-los às Finanças, a não ser que se enquadre nas situações em que há dispensa da entrega da declaração de IRS.
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Dispensa de entrega da declaração Modelo 3 de IRS
As condições para haver lugar à dispensa da entrega da declaração anual de IRS estão previstas no artigo 58.º do CIRS.
Fica dispensado de entregar a declaração de IRS se recebeu, isolada ou conjuntamente (n.º 1 e 2 do art. 58.º do CIRS):
- Rendimentos do trabalho dependente, ou de pensões, até 8.500 euros se não foram sujeitos a retenção na fonte;
- Pensões de alimentos até 4.104 euros;
- Rendimentos tributados por taxas liberatórias, como juros de depósitos bancários ou dividendos, se não optar pelo seu englobamento;
- Subsídios ou subvenções da Política Agrícola Comum (PAC), de montante inferior a 4 vezes o valor do IAS, desde que, tendo recebido outros rendimentos, tenham sido tributados por taxas liberatórias, ou sendo rendimentos do trabalho dependente, ou de pensões, não excedam, isolada ou conjuntamente, 4.104 €;
- Rendimentos de atos isolados, de valor anual inferior a 4 vezes o valor do IAS (4 x 480,43 € em 2023 e 4 x 509,26 € em 2024), se não recebeu outros rendimentos, ou recebeu apenas rendimentos tributados por taxas liberatórias.
No entanto, não estão abrangidos por estas situações de dispensa de declaração os sujeitos passivos que (n.º 3 do art. 58.º do CIRS):
- Optem pela tributação conjunta, caso sejam casados ou unidos de facto;
- Recebam rendas temporárias e vitalícias que não se destinem ao pagamento de pensões de reforma, velhice, sobrevivência ou invalidez;
- Recebam rendimentos em espécie;
- Recebam pensões de alimentos de valor superior a 4.104 euros.
Portanto, a dispensa de entrega da declaração não está relacionada unicamente com rendimentos não sujeitos a IRS, mas também com o valor total anual dos rendimentos e a sua natureza, a sujeição a taxas liberatórias e respetiva opção de englobamento, e a opção de tributação (para casados e unidos de facto).
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Pode entregar a declaração de IRS se estiver dispensado de o fazer?
A resposta é: sim.
Há várias situações em que a declaração de IRS é solicitada como, por exemplo, para pedir um crédito junto de uma instituição bancária, para arrendar uma casa ou para a candidatura do próprio ou de um dependente a uma bolsa de estudo.
Para estes casos, a pedido do contribuinte, a AT emite uma certidão gratuita com o montante e natureza dos rendimentos que lhe foram comunicados e que constam da sua base de dados, bem como o respetivo imposto suportado (n.º 5 do art.º 58.º do CIRS). O pedido da certidão pode ser efetuado após terminar o prazo de entrega da Modelo 3, ou seja, após 30 de junho.
Para solicitar à AT a certidão comprovativa dos rendimentos aceda ao Portal das Finanças, em “Os Seus Serviços” selecione “Entregar” > “Pedido” > “Dispensa Entrega IRS”. Introduza o ano em questão no campo “Ano de Rendimentos” e registe o pedido no botão “Registar”.
No entanto, pode submeter a declaração Modelo 3 de IRS dentro do prazo legal (1 de abril a 30 de junho) se assim preferir.
Por outro lado, se é casado ou unido de facto, estando dispensado de entregar a Modelo 3, deve sempre simular a entrega da declaração conjunta para saber qual é a opção mais favorável. Escolha a situação que mais beneficiar o agregado familiar.
Subsídios sociais e prémios de jogo estão sujeitos a IRS?
É frequente surgirem dúvidas relacionadas com a obrigatoriedade de declarar, ou não, determinadas verbas recebidas, entre as quais:
- Subsídio de desemprego;
- Subsídio de doença (baixa médica);
- Rendimento Social de Inserção (RSI);
- Abono de família;
- Subsídio parental (licença de maternidade e paternidade);
- Prémios de jogos e sorteios.
As prestações sociais pagas pela Segurança Social e os prémios de jogos não estão sujeitos a IRS, pelo que não é necessário declará-los às Finanças. No entanto, se recebeu algum destes subsídios ou prémios não significa que não esteja obrigado a entregar a declaração Modelo 3.
Caso tenha recebido ao longo do ano, ou parte dele, um subsídio ou prémio de jogo e não tenha acumulado com rendimentos sujeitos a IRS, está dispensado de entregar a Declaração Modelo 3.
Se recebeu subsídio ou prémio de jogo ao longo do ano, ou parte dele, e acumulou com outros rendimentos sujeitos a IRS, só estará dispensado de entrega da Modelo 3 se se enquadrar nas regras do artigo 58.º do CIRS (dispensa de apresentação de declaração) e caso não opte pela tributação conjunta.
Se recebeu subsídio ou prémio de jogo ao longo do ano, ou parte dele, e acumulou com outros rendimentos sujeitos a IRS e, de acordo com o art. 58.º do CIRS, não está dispensado de apresentar a declaração, não é obrigado a declarar os valores recebidos a título de subsídio social ou prémio de jogo na sua Modelo 3 de IRS.
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Economista e Contabilista Certificada, licenciada em Organização e Gestão de Empresas pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Exerce atividade na área da Consultoria para os Negócios e a Gestão desde 1997. Desempenha as funções de Consultora Sénior e CEO na sociedade VVL Consultores da qual é sócia fundadora.
A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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