Nos últimos tempos muito se tem falado sobre criptomoedas e se estas são um bom investimento, dado que o valor de uma bitcoin, em março de 2021, é superior a 47 mil euros. Embora as opiniões sobre este tipo de investimento sejam muito divergentes, a verdade é que vários portugueses têm investido em moedas virtuais nos últimos anos e a falta de uma legislação e enquadramento mais pormenorizado tem levantado muitas dúvidas. E caso tenha investido em moedas digitais, é normal que se pergunte se deve declarar os seus rendimentos com criptomoedas no IRS.
Por isso, de seguida, vamos explicar-lhe o que se sabe sobre o enquadramento fiscal das criptomoedas, e quais são as suas obrigações. Saiba ainda que cuidados deve ter caso um dia venha a precisar de justificar os seus rendimentos, mas também caso pretenda investir.
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As criptomoedas como ativos
Para quem não está muito a par desta temática, as criptomoedas são um tipo de dinheiro digital, que não se encontra regulamentado nem vinculado a qualquer Banco Central. Este tipo de dinheiro virtual é emitido e, por norma, também controlado por quem o desenvolve, podendo ser usado como forma de pagamento numa comunidade que o aceite ou ainda ter outras finalidades, como a atribuição do direito à utilização de determinados bens e serviços ou a um retorno financeiro.
As criptomoedas são ativos armazenados digitalmente através da tecnologia blockchain, tendo esta sido considerada como segura, uma vez que a mesma está descentralizada. Atualmente a criptomoeda mais conhecida é a bitcoin, no entanto, existem inúmeras moedas digitais com o seu valor estipulado por cada unidade, tal como acontece com as ações do mercado financeiro. Ou seja, tal como acontece com as ações, as criptomoedas são hoje em dia um investimento atrativo para muitas pessoas, tendo cada uma delas o seu valor, que pode subir ou descer dependendo de múltiplas variáveis. Contudo, este é um investimento que acarreta bastantes riscos, uma vez que o seu mercado é instável e não é regulado.
É ainda importante salientar que ao termo "criptoativo" por norma estão associados os tokens, coins, criptomoedas ou moedas virtuais.
Qual é a legislação sobre os rendimentos com criptomoedas no IRS?
Embora a Comissão Europeia já tenha proposto em setembro de 2020 um novo Regulamento sobre Mercados em Criptomoedas, atualmente não existe uma legislação comunitária sobre ativos digitais. Além da falta de uma regulamentação comunitária sobre as criptomoedas, o que deixa os investidores desprotegidos nas transações e/ou investimentos que realizem dada à volatilidade destes capitais, em termos legais e fiscais, em Portugal não existe um enquadramento concreto das criptomoedas.
No entanto, isso não quer dizer que até agora a Autoridade Tributária e Aduaneira não se tenha pronunciado sobre o tema, quando questionada pelos contribuintes. Existem atualmente dois despachos onde a AT se pronunciou sobre a tributação e enquadramento das criptomoedas, o processo n.º 14910 e o processo n.º 5717/2015. Embora essa informação vinculativa da AT tente esclarecer algumas questões, ainda existem muitas perguntas sem respostas nesta matéria.
Contudo, o que precisa saber é que caso não exerça uma atividade profissional ou empresarial onde existe a compra e venda habitual de criptomoedas, os rendimentos com criptomoedas não se enquadram em nenhuma das categorias previstas no Código do IRS, pelo que não ficam sujeitos a tributação. Isto quer dizer, que se tiver alguns rendimentos com criptomoedas, como investimento e não a nível profissional, não precisa de declarar os mesmos no seu IRS, nem pagará IRS sobre os mesmos.
É importante referir que já há alguns anos se fala que esta situação está prestes a mudar, e por isso deve sempre estar atento ao que é determinado pelo Governo ou à publicação de propostas de lei sobre esta matéria.
Quem é obrigado a declarar os rendimentos com criptomoedas no IRS ou IRC?
Tal como referimos anteriormente, os rendimentos derivados da venda de criptomoedas não se enquadram em nenhuma categoria do Código do IRS para a maioria das pessoas. No entanto, caso os rendimentos com criptomoedas estejam ligados à sua atividade profissional ou empresarial, então estes devem ser declarados e tributados como rendimentos da categoria B do IRS.
Já no caso de estarmos a falar de uma empresa que se dedique habitualmente à compra e venda de criptomoedas, e a mesma preencha IRC existem ainda bastantes dúvidas. Contudo, muitos especialistas defendem que os ganhos com criptomoedas constituem rendimentos do período associado ao lucro tributável, estando estes previstos no artigo n.º20 do Código do IRC. Ou seja, pode-se entender que os ganhos e perdas devem ser tratados como diferenças cambiais, tendo em consideração a contraprestação em euros, no caso concreto de Portugal.
Contudo, é ainda fundamental informar-se sobre várias questões como a aplicação de IVA, embora possa existir a isenção do mesmo, e como deve ser feita a faturação deste tipo de transações. Em caso de dúvida, o melhor é tentar consultar um contabilista certificado com experiência nesta matéria, de forma a saber como agir e não ter problemas mais tarde.
Podem pedir-me que justifique os rendimentos com criptomoedas mesmo que não precise de declarar os mesmos no IRS?
Sim, existe essa possibilidade, principalmente caso adquira alguns ativos ou tenha despesas elevadas para os seus rendimentos que sejam englobadas no conceito de manifestação de fortuna. Lembre-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira controla a manifestação de fortuna de cada contribuinte caso detete um aumento de património. Nesse caso concreto, a AT vai cruzar esses dados com a sua declaração de IRS e tentar perceber se os seus rendimentos justificam o aumento do seu património.
Por isso, para prevenir alguns problemas que possam ocorrer no futuro por não ter declarado os rendimentos com criptomoedas no IRS, mesmo não sendo obrigado a tal, o melhor é manter um registo capaz de justificar a origem dos seus rendimentos. Ou seja, caso tenha ganhos significativos com criptoativos, o melhor é guardar comprovativos desses rendimentos. Desta forma, caso um dia venha a ser chamado para fazer prova de rendimentos junto da AT terá em sua posse toda a documentação necessária para tal.
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Que cuidados devo ter caso pretenda investir em criptomoedas?
Uma vez que o investimento em criptomoedas deve ser considerado como um investimento de risco, principalmente dado que é um mercado bastante incerto, é importante que tente ao máximo compreender todas as caraterísticas destes ativos e os riscos que acarretam. O ideal neste tipo de investimento é que pense antecipadamente se pode suportar o valor da perda do montante que investiu. Caso esse montante represente uma perda que não pode suportar, então o melhor é não investir em criptomoedas e aplicar esse montante num investimento de baixo risco, mesmo que a rentabilidade seja baixa.
O investimento em moedas virtuais ainda acarretam diversos riscos, como:
- Risco de liquidez;
- Elevada volatilidade: estes ativos são propensos a variações de preços súbitas e amplas.
- Pouca informação técnica ou informação detalhada insuficiente;
- Risco de perda parcial ou total do capital investido: Neste caso, este não é apenas um risco das criptomoedas, mas sim de todos os investimentos de risco elevado.
- Inexistência de regulamentação e proteção dos investidores que tenham criptoativos que não sejam valores mobiliários;
- Problemas na gestão de conflitos: Dado que a maioria dos agentes que comercializam criptoativos não estão sedeados em Portugal, pode haver alguma dificuldade na resolução de conflitos, uma vez que está fora da competência das autoridades nacionais esta resolução.
Estes são apenas alguns dos riscos relacionados com o investimento em criptomoedas. Caso pretenda saber mais sobre os riscos atuais deste tipo de ativos, a CMVM dispõe de algumas respostas a perguntas frequentes sobre os criptoativos e os seus investidores.
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A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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