2024 foi muito favorável para os investidores, com a generalidade dos ativos cotados a fecharem o ano com valorizações bastante atrativas, sobretudo no mercado de ações. O ano em que analistas e economistas antecipavam que seria marcado por uma travagem acentuada da atividade económica global e cortes de juros agressivos por parte dos bancos centrais, acabou por ter uma história bastante diferente, muito por culpa dos Estados Unidos.
A maior economia do mundo registou mais um desempenho excecional, o que foi fundamental para a dinâmica positiva dos mercados financeiros. Contrariando as expectativas de recessão, o PIB norte-americano cresceu 1,6% no primeiro trimestre, 3% no segundo e 3,1% entre julho e setembro. O mercado de trabalho continuou muito robusto e a inflação acentuou a trajetória descendente, embora sem chegar à meta dos 2%.
Estes desenvolvimentos ditaram uma redução menos ampla do que o previsto nos juros da Fed, mas deram confiança aos investidores para reforçarem a aposta nos ativos de risco num ambiente de soft landing (aterragem suave da economia, em português). O dólar foi um dos claros vencedores de 2024, até porque a economia europeia acentuou a evolução débil.
As obrigações voltaram a gerar retornos magros devido ao alívio de juros menos agressivo do que era esperado. Apesar do agravamento da instabilidade geopolítica mundial não ter afetado as ações, contribuiu para reforçar a atratividade do ouro, um dos ativos que mais brilhou e surpreendeu em 2024. E não impediu um retorno negativo no petróleo, num ano em as cotações de várias matérias-primas agrícolas dispararam.
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Ações mundiais valorizam 20%
O MSCI ACWI, que mede o desempenho das ações mundiais (mercados desenvolvidos e emergentes) valoriza perto de 20% desde o início do ano, aproximando-se do retorno já muito forte alcançado em 2023 (22,8%). Embora a bolsa norte-americana seja fundamental para esta performance, as ações asiáticas também registaram um ano muito positivo. Já na Europa os retornos voltaram a ser dececionantes, embora com desempenhos bem distintos entre os vários países.
Nos últimos 10 anos, este índice acumula um ganho médio anual de 9,8% (medido em dólares), validando a ideia de que as ações são o melhor ativo para investir numa lógica de longo prazo.
Tecnológicas voltam a brilhar em Wall Street
Além da evolução favorável da economia, as bolsas norte-americanas voltaram a beneficiar de mais um ano excecional das grandes tecnológicas, repetindo o desempenho de 2023 à boleia da continuação do “boom” da Inteligência Artificial. A vitória de Donald Trump acentuou a tendência positiva, com os investidores otimistas com o impacto das promessas protecionistas do presidente eleito dos EUA: corte de impostos, aumento de tarifas e desregulação.
O S&P500 dispara 25,2% em 2024, no melhor registo desde 2021 que supera ligeiramente o retorno de 2023 (24,2%). O índice atingiu 57 máximos históricos este ano, que fica para a história por uma estatística rara: foi apenas a quarta vez em 100 anos que consegue dois anos seguidos a valorizar mais de 20%. A última foi em 1997/1998, mostrando a força do rally atual em Wall Street que iniciou em outubro de 2022.
Este momento está sobretudo relacionado com o desempenho das grandes tecnológicas, pois as Sete Magníficas (Alphabet, Amazon, Apple, Meta Platforms, Microsoft, Nvidia e Tesla) valorizam 70% em 2024 e representam mais de metade da subida do S&P500 este ano, tal como já tinha acontecido em 2023. Reflexo desta performance superior das grandes tecnológicas, o índice Nasdaq dispara 31,4% em 2024 (43% em 2023). A Nvidia voltou a ser o grande destaque, com as ações da fabricante de chips a quase triplicarem em 2024.
Europa fica para trás num ano desigual
As bolsas europeias também conseguem o segundo ano consecutivo de ganhos, mas com retornos muito mais contidos. O Stoxx600, índice que agrupa as maiores cotadas europeias, valoriza 5,9% em 2024 (12,7% em 2023), sendo que a diferença para o índice norte-americano S&P500 é a mais acentuada em 25 anos. Além do setor tecnológico ter um peso bem menos preponderante nas bolsas europeias, a economia também registou um desempenho bem mais fraco do que a norte-americana, acentuando uma divergência que se arrasta há anos.
Apesar do retorno fraco do Stoxx600, 2024 fica marcado por um desempenho muito desigual entre as várias bolsas europeias, sendo que a divergência fica sobretudo patente nos retornos dos índices bolsistas das duas maiores economias da Zona Euro. O alemão DAX marca ganhos em torno de 20% pelo segundo ano seguido apesar de a economia estar estagnada desde a pandemia e de o governo ter colapsado no final do ano. Já o francês CAC é dos poucos índices mundiais com retornos negativos (-2,5%), refletindo a instabilidade política gerada com a decisão do presidente Emmanuel Macron convocar eleições legislativas antecipadas e o agravamento das contas públicas do país. No ano em que a estabilidade política regressou ao Reino Unido após a vitória esmagadora dos Trabalhistas, o FTSE valorizou uns modestos 5,4%.
Bolsa portuguesa sem energia
A bolsa portuguesa volta a estar no lote das desilusões, com o PSI a fechar 2024 praticamente no mesmo nível com que iniciou o ano, depois de em 2023 ter conseguido ganhos de dois dígitos (11,7%).
O elevado nível das taxas de juro impulsionou a cotação das ações do BCP (64,1% em 2024), mas foi fortemente penalizadora para as cotadas de energias renováveis, com as ações da EDP (-31,4%) e EDP Renováveis (-47,9%) a liderarem as quedas no PSI. A Jerónimo Martins (-20,9%) também penalizou o índice português, enquanto a Galp Energia (26%) tirou partido de uma mega descoberta de petróleo na Namíbia.
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Estímulos impulsionam ações chinesas
O desempenho dececionante da economia chinesa é um dos grandes destaques de 2024, com a segunda maior economia do mundo a ser castigada por uma crise no imobiliário sem fim à vista, consumo interno fraco e desconfiança dos investidores internacionais que motivou uma fuga de capitais sem precedentes. Depois de ter desvalorizado mais de 10% em 2023, o índice CSI300 prolongou a tendência negativa na primeira metade do ano, mas vai fechar o ano com uma valorização assinalável de 17,6%.
A situação inverteu-se em setembro, quando as autoridades em Pequim apresentaram finalmente um plano poderoso para impulsionar a economia chinesa através de estímulos orçamentais (aumento da despesa pública) e monetários (corte de juros).
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Ações japonesas voltam a brilhar
Depois de décadas de marasmo devido a uma economia presa numa situação de deflação e fraco crescimento, as ações japonesas regressaram definitivamente ao radar dos investidores internacionais, beneficiando também com um conjunto de reformas estruturais para reforçar a atratividade do seu mercado de capitais.
Depois de uma valorização excecional em 2023 (28,2%), o índice Nikkei volta a valorizar 20% em 2024, um ano que fica marcado pela decisão do banco central em retirar a taxa de juro de terreno negativo. A alteração ainda provocou um pequeno terramoto nos mercados mundiais no verão (Nikkei chegou a cair mais de 12% numa só sessão), mas a situação acalmou depois de o Banco do Japão ter sinalizado que iria subir os juros de forma cautelosa.
Bolsa brasileira é a pior do mundo em 2024
Num ano em que as bolsas globais registaram um ano muito positivo, a praça brasileira fecha 2024 com um péssimo desempenho devido à desconfiança dos investidores com o compromisso do governo brasileiro em controlar as contas públicas. Depois de meses a protelar a apresentação de medidas para baixar o défice orçamental, o Executivo de Lula da Silva apresentou um plano orçamental que foi considerado dececionante pelos investidores.
O real caiu para mínimos históricos e a fuga de capitais da maior economia da América Latina levou o Ibovespa a acumular perdas de 10% no ano. O suficiente para merecer o pouco abonatório título de pior bolsa do mundo em 2024 entre os principais mercados desenvolvidos e emergentes.
Obrigações com retornos magros
Aquele que era expetável ser um grande ano para as obrigações, acabou por ser dececionante para os investidores em títulos de dívida. Estes ativos beneficiam com as perspetivas de descida da inflação, alívio da política monetária e abrandamento do crescimento económico, mas a evolução muito positiva da economia norte-americana acabou por trocar as voltas aos investidores.
Apesar da manutenção das yields das obrigações em níveis historicamente elevados, os títulos de dívida renderam apenas 1% nos EUA e pouco mais de 2% na Zona Euro. A nível global, devido ao mau desempenho das obrigações dos mercados emergentes, o retorno foi mesmo negativo (-1,8%).
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Dólar com melhor ano no mercado desde 2017
As expetativas iniciais também apontavam para um ano fraco do dólar, a moeda até registou quedas acentuadas no verão, mas fecha 2024 com uma tendência muito forte. A moeda norte-americana ganhou terreno a todas as divisas de economias desenvolvidas e o índice do dólar sobe 7% em 2024, o que representa o melhor desempenho anual desde 2017.
A evolução robusta da maior economia do mundo, em conjunto com a manutenção da inflação em níveis elevados, travou as expetativas de corte de juros por parte da Fed. A vitória de Trump nas eleições reforçou os argumentos para a alta do dólar, que continua imune às ameaças de perder preponderância para outras moedas como reserva de valor a nível global.
O euro sofre em 2024 uma queda superior a 5% e está a caminho da paridade face ao dólar (ou seja ter mesmo valor), com a moeda única a ser castigada pelo fraco crescimento económico, perspetiva de descida de juros do BCE em 2025 (150 pontos base) e desconfiança dos investidores com as contas públicas em França e situação política na Alemanha.
O iene sofre uma queda ainda mais intensa (-10,6%). O Banco do Japão até subiu os juros, mas manteve uma política monetária ultra acomodatícia. Entre as 10 moedas mais negociadas do mundo, a coroa da Noruega e o dólar da Nova Zelândia também marcam perdas de dois dígitos face à divisa norte-americana.
Ouro brilha num ano positivo para as matérias-primas
Num ano em que as matérias-primas também registam um desempenho favorável, o principal destaque vai para o ouro, que marca ganhos superiores à grande maioria dos índices acionistas globais e consegue o melhor registo anual desde 2010. Apesar da alta do dólar penalizar a atratividade do metal precioso, o ouro valoriza 27% este ano, beneficiando da instabilidade geopolítica, reforço das compras de bancos centrais para diversificar reservas e aumento da procura física e por parte dos investidores.
Contudo, há matérias-primas que marcam valorizações bem mais expressivas, refletindo o impacto de condições climatéricas adversas e pragas nos principais países produtores. É o caso do cacau (+158%) e do café (72%), que marcam variações que deverão refletir-se no bolso dos consumidores em todo o mundo ao longo do próximo ano.
O petróleo marca o segundo ano consecutivo de retornos negativos, penalizado sobretudo pela evolução fraca da procura na China, que é o maior consumidor do mundo desta matéria-prima. O Brent, que serve de referência para as importações portuguesas, recua 4% este ano, afastando-se cada vez mais da barreira dos 100 dólares que quebrou em 2022 após o início da guerra na Ucrânia. Apesar da forte instabilidade no Médio Oriente, região onde é produzido mais de um terço do petróleo consumido em todo o mundo, o desequilíbrio entre a procura e a oferta acabou por ter um peso mais relevante na evolução das cotações do “ouro negro”.
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Bitcoin quebra barreira histórica em 2024
As criptomoedas viveram um ano de 2024 excecional, beneficiando sobretudo com dois fatores. Logo no início do ano o regulador norte-americano aprovou finalmente o lançamento de fundos de Bitcoin, abrindo portas a um elevado fluxo de investimento indireto nesta criptomoeda por parte dos investidores de retalho e institucionais.
A vitória de Trump foi outro importante catalisador para a Bitcoin, pois o presidente eleito é um defensor destes ativos digitais e promete desregular o mercado. A Bitcoin superou em dezembro a barreira dos 100 mil dólares e acumula uma valorização de 127% em 2024.
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Nasceu em 1977, sendo jornalista desde 1999. Iniciou a carreira no Jornal de Negócios, onde esteve mais de 20 anos, ocupando várias funções, sempre com foco no online. Atualmente é jornalista independente, assina a newsletter diária de mercados Morning Call e colabora de forma regular com o ECO. Formado em Gestão no ISEG, tem especial interesse por tudo o que está relacionado com os mercados financeiros.
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