Investimentos

Correção das tecnológicas impulsiona “Grande Rotação” nas Bolsas

O setor tecnológico está finalmente a mostrar alguma debilidade, levado os investidores a olhar com maior atenção para os setores mais esquecidos.

Depois de as grandes tecnológicas norte-americanas terem concentrado os ganhos nas bolsas desde o final de 2022, há vários meses que nos mercados se aguarda a inversão desta tendência, com uma valorização mais abrangente e diversificada entre as ações de diferentes setores. Um comportamento que muitos analistas consideram ser essencial para que as bolsas continuem numa trajetória global positiva.

Este movimento é conhecido nos mercados por “Grande Rotação” e há sinais evidentes de que está finalmente acontecer. As tecnológicas estão a perder o brilho dos últimos meses e as cotadas que passaram ao lado dos ganhos neste período de alta nas bolsas estão finalmente a entrar no radar dos investidores. A aposta está a ser transferida das empresas de crescimento (growth stocks) para as companhias de valor (value stocks). E das empresas de maior dimensão (Big Caps) para as companhias de valor mais baixo (small caps).

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"Grande Rotação" mostra força nas últimas semanas

A “Grande Rotação” arrancou neste mês de julho, coincidindo com dois momentos-chave. Os Estados Unidos anunciaram, a 11 de julho, uma descida inesperada da inflação de junho, abrindo caminho para a Fed começar a baixar os juros a partir de setembro. Uns dias depois, a Tesla e a Alphabet (dona do Google) deram o pontapé de saída na época de resultados com notícias desfavoráveis, dando argumentos para os investidores colocarem em causa se as grandes tecnológicas já esgotaram o potencial de valorização.

As variações registadas pelos índices acionistas nas últimas semanas demonstram a força desta rotação de investimentos, sendo mais evidentes nos Estados Unidos. Desde 11 de julho, o Nasdaq Composite (índice das tecnológicas) desvaloriza 8% e o S&P500 (índice generalista) cede 3,5%, enquanto o Russell 2000 (índice de “ small caps”) avança perto de 11%.

Este desempenho permitiu encurtar as distâncias que se verificavam desde o início do ano. O Nasdaq e o S&P500 marcam agora uma valorização em torno de 14% em 2024, enquanto o Russell 2000 valoriza mais de 9%. No final do primeiro semestre, o índice que agrupa as small caps dos Estados Unidos acumulava perdas e o grupo das tecnológicas valorizava mais de 20%.

Para se ter uma ideia do domínio das grandes tecnológicas no primeiro semestre, as seis maiores foram responsáveis por metade do avanço do S&P500, que é composto pelas 500 maiores companhias norte-americanas. Este índice tem um peso preponderante de tecnológicas, sendo que se for calculado atribuindo o mesmo peso a todas as empresas, a diferença do desempenho foi a mais larga desde 1999.

No acumulado dos últimos dois anos, as discrepâncias ainda são muito marcadas, com o índice das tecnológicas a valorizar 38%, o dobro do ganho alcançado pelo Russell 2000 no mesmo período. Uma diferença que sugere que há margem para encurtar ainda mais a distância entre as tecnológicas e as companhias dos outros setores.

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Tecnológicas menos magníficas

Os máximos históricos alcançados pelas bolsas globais foram impulsionados pelas tecnológicas, com destaque para as companhias de maior dimensão. Foi neste período que ficou conhecido o termo "Sete Magníficas", utilizado para designar sete tecnológicas de grande dimensão: Alphabet, Amazon, Apple, Meta Platforms, Microsoft, Nvidia e Tesla.

À boleia da euforia com o desenvolvimento da Inteligência Artificial (o ChatGPT foi lançado no final de 2022) e de uma evolução notável dos resultados, estas companhias concentraram as atenções dos investidores, ofuscando a aposta noutras empresas. A Nvidia foi o expoente máximo desta evolução, com a cotação a disparar mais de oito vezes em apenas dois anos, levando a fabricante de chips a atingir o estatuto de cotada mais valiosa do mundo, com uma capitalização bolsista acima de 3 biliões de dólares.

As últimas sessões foram bem diferentes. As “Sete Magníficas” recuam mais de 10% e a Nvidia desvaloriza 17% desde que atingiu máximos, em meados de junho. São vários os argumentos que justificam esta evolução, estando ainda para saber se esta é uma mera e saudável correção, ou um movimento mais pronunciado de descida das cotações das tecnológicas:

  • Múltiplos elevados. Os investidores estão mais preocupados com as elevadas avaliações a que transacionam as tecnológicas, que exigem um crescimento de lucros muito mais forte que o está a ser previsto pelos analistas para que as cotações continuem a subir. As tecnológicas do S&P500 estão a transacionar a 29,5 vezes os lucros estimados para os próximos meses (PER), muito perto do máximo de duas décadas fixado no início deste mês. Ainda assim, o múltiplo é inferior ao registado na bolha das dotcom (em 2000 o PER da tecnológicas atingiu 48 vezes).
  • Investimento alto. As tecnológicas continuam a apresentar resultados fantásticos, superando facilmente as estimativas dos analistas ao nível das receitas e dos lucros. Contudo, há uma rubrica que está a gerar cada vez maior apreensão. Os investimentos que as tecnológicas estão a efetuar para tomar a dianteira na Inteligência Artificial estão a crescer a um ritmo muito elevado, levando os investidores a temer que vai demorar muito mais tempo a recolher os benefícios da aposta na nova tecnologia.

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Setores tradicionais recuperam atratividade

Bancos, utilities, empresas industriais e cotadas de outros setores mais tradicionais estão a atrair o capital que está a abandonar as grandes tecnológicas, aproveitando também outros fatores que estão a impulsionar esta “Grande Rotação”. Estes são os principais fatores que justificam a tendência:

  • Corte de juros. As descidas de juros que já iniciaram na Europa e estão prestes a acontecer nos Estados Unidos beneficiam sobretudo as empresas de menor dimensão e de capital intensivo, que tiram partido dos custos de financiamento mais reduzidos.
  • Economia resiliente. O ciclo de corte de juros inicia numa altura em que a economia global continua num momento positivo, sobretudo nos Estados Unidos, onde a resiliência tem sido notável. Esta conjuntura beneficia sobretudo as companhias cíclicas e que estão mais dependentes da atividade económica e do nível de consumo das famílias.
  • Avaliações atrativas. Se as tecnológicas estão com múltiplos elevados, muitos outros setores transacionam em bolsa com avaliações atrativas. O Stoxx600, índice europeu composto sobretudo por empresas de “valor”, apresenta um PER de abaixo de 14 e alinhado com a média histórica dos últimos 20 anos. O índice norte-americano S&P500 negoceia a mais de 20 vezes os lucros estimados para os próximos 12 meses, o que está acima da média histórica, mas excluindo o contributo das 15 maiores cotadas, o múltiplo baixa para um nível mais “normal” (18,5 vezes).   

Para as ações das grande tecnológicas continuarem com um desempenho magnífico, as cotadas terão de mostrar, através de resultados que merecem as valorizações conquistadas ao longo dos últimos meses. Mesmo neste cenário otimista, será pouco provável que consigam travar esta “Grande Rotação”, pois os investidores vão reforçar a atenção noutros setores que oferecem perspetivas mais favoráveis e com risco mais reduzido. Isto se se confirmar as descidas de juros por parte dos bancos centrais e uma evolução positiva da economia global.

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Nasceu em 1977, sendo jornalista desde 1999. Iniciou a carreira no Jornal de Negócios, onde esteve mais de 20 anos, ocupando várias funções, sempre com foco no online. Atualmente é jornalista independente, assina a newsletter diária de mercados Morning Call e colabora de forma regular com o ECO. Formado em Gestão no ISEG, tem especial interesse por tudo o que está relacionado com os mercados financeiros.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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