Cultura e Lazer

Do petróleo às energias limpas é só mudar de tabuleiro

Primeiro, assumir o controle de uma refinaria de petróleo e produzir mais e mais! Depois, ser o CEO de uma empresa de energias verdes e salvar o planeta.

Primeiro, assumir o controle de uma refinaria de petróleo e produzir mais e mais! Depois, ser o CEO de uma empresa de energias verdes e salvar o planeta.

Nisto dos jogos de tabuleiro, um dos grandes prazeres está na possibilidade de nos afastarmos um pouco da nossa personalidade para adotar, sem problemas de consciência, uma postura diferente. Qual é o mal, durante um par de horas, de sermos um magnata da indústria petrolífera? Pois bem, o contexto de Pipeline (2019) leva-nos até a uma nação sem nome onde as refinarias de petróleo estão sob o controle estatal. Porém, as pressões da procura de petróleo e a exigência do mercado por um produto de maior qualidade, obrigaram o governo a rever a política para o sector da energia.

Decididamente, a nova era requer medidas drásticas para dar a volta ao complexo e ineficiente sistema de refinarias do país. A única solução passa por privatizar. E eis que entram em cena os jogadores, sedentos de capitalizar esta oportunidade na lucrativa indústria petrolífera. Para tal, vai ser preciso construir uma rede de tubagens mais eficiente, aprimorar as operações com vista a obter ganhos competitivos, e navegar sabiamente pelos meandros do mercado mundial de compra e venda de petróleo refinado. Quem irá ganhar? Quem fizer mais dinheiro, claro!

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Ah, a riqueza dos combustíveis fósseis!

Logo ao separar as peças e cartas de Pipeline percebe-se que esta será uma partida de milhões, pois as fichas de dinheiro têm valores entre o 1 e os 500. Ao jogador feito empresário, pede-se que tome inúmeras decisões ao longo dos três anos que Pipeline simula. Aos funcionários podem atribuir-se ações como comprar e vender crude ou petróleo refinado, aceitar contratos (que podem ficar logo ativos ou serem deferidos para um ano seguinte), contrair empréstimos, adquirir máquinas, tanques e tubagens para a rede de distribuição, gerir partes dos ramais de tubagens do governo, ou aumentar a infraestrutura própria de refinação.

Existem três tipos de petróleo, representados por diferentes cores, sendo que cada tipo pode atingir diferentes níveis de qualidade, desde o simples crude até ao petróleo de alta qualidade. Quanto melhor o produto final, mais valioso será no mercado. Mas na área dos upgrades, o jogador também pode apostar em melhorar a relação com o governo (que vai dando mais benefícios à medida que se sobe de nível), ou na melhoria dos recursos humanos, da maquinaria, da engenharia ou das lojas.

Um bom planeamento estratégico facilitará a tarefa de cumprir as exigências dos contratos e das ordens de compra assinados. E atenção que, no final, recebem-se penalidades pelos contratos não cumpridos. Para compensar, os barris de petróleo em armazém acrescentam mais uns milhões à conta dos jogadores. Enfim, o que importava era, sobretudo, produzir. Como se não houvesse amanhã.

Uma nova oportunidade de salvar o planeta

Caixa do Jogo de tabuleiro Pipeline

Mas há. Por isso, se a consciência pesar um pouco por se ter incrementado tanto a produção de petróleo só para conseguir a vitória na última ronda, podemos sempre mudar de tabuleiro. O jogo CO2 – Second Chance dá-nos, precisamente uma segunda hipótese, ao colocar-nos no papel de CEO de uma companhia que opera no mundo das energias renováveis. Após décadas de exigências energéticas que subiram, ano após ano, os níveis de poluição atmosférica, chegou a vez de tentar evitar o colapso do nosso planeta. Neste tabuleiro, o objetivo dos jogadores passa por corresponder às necessidades energéticas dos governos, através de formas sustentáveis e, claro, também lucrativas.

Como estamos perante mais uma criação do designer de jogos português Vital Lacerda, podemos contar com uma verdadeira imersão no tema e um jogo relativamente complexo que, neste caso, se desenrola ao longo de quatro décadas. Nesses espaços de dez anos, a fase de operações representa o tempo em que as empresas propõem e implementam os seus projetos, que podem passar por unidades de reciclagem e centrais de energia hídrica, solar ou eólica. Também se incluiu no jogo projetos de reflorestação, por serem um elemento crucial no controlo e redução da emissão de gases de carbono. Estas novas centrais de energia limpa são essenciais para aliviar a grave situação climática e podem receber recompensas por parte das Nações Unidas. E, ao mesmo tempo, todas estas movimentações acabam por estimular a economia mundial.

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Cientistas e lobistas, no mesmo tabuleiro?

Os CEO podem, no entanto, fazer ainda mais coisas. Por exemplo, aumentar o conhecimento da empresa, distribuindo os seus cientistas por novos projetos; depois, essas descobertas serão apresentadas nas cimeiras do ambiente, com as devidas recompensas em termos de prestígio e não só. Por estarmos num sector que passa inevitavelmente pelos decisores políticos, também é possível tentar manipular o mercado de Permissões para a Emissão de Carbono e usar lobistas que facilitem a obtenção dos objetivos de cada empresa.

Será na fase de fornecimento de energia que todas as decisões serão avaliadas. Se as regiões não conseguirem obter a energia de que necessitam através de fontes ecológicas, então vão ter de recorrer aos combustíveis fósseis. E lá voltam a aumentar os níveis de emissões de carbono, o que dificulta a tarefa de dar ao planeta uma segunda oportunidade.

Assim até se dorme mais descansado

De facto, no final de CO2 o importante não será o dinheiro amealhado. Os pontos de vitória de cada companhia resultam da reputação, do conhecimento sobre diferentes fontes de energia limpa e do contributo para a preservação do ambiente. Em CO2, aliás, existem metas ambientais que são comuns a todos os jogadores. Há até um modo de jogo inteiramente cooperativo, mas mesmo no tradicional modo competitivo, em que uns tentam ser melhores do que os outros, se ao findar de cada década os pontos de vitória do grupo de jogadores estiver abaixo de zero, então todos perdem. É como se o planeta dissesse que aqueles CEO não fizeram o suficiente e, por já não aguentar mais, resolvesse implodir.

Felizmente, neste caso, recomeçar é só uma questão de montar novamente o início do jogo. E de, enquanto se faz essa tarefa, alguém poder ler alto as pequenas definições que o livro de regras trás sobre a comunidade científica (e os alertas que tem deixado sobre as alterações climáticas), as centrais de energia verde, a importância do investimento na pesquisa, os mercados de carbono, as cimeiras do ambiente ou as metas das Nações Unidas para 2030.    

Se conseguimos salvar o mundo, nem que seja num tabuleiro, talvez consigamos dormir um pouco mais descansados. Ou pelo menos aliviados por termos resolvido os estragos feitos em Pipeline

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Paulo M. Morais cresceu a jogar futebol de rua e a ouvir provérbios ditos pelas avós. Licenciou-se em Comunicação Social e especializou-se nas áreas do cinema, dos videojogos e da gastronomia. É autor de romances e livros de não ficção. Coleciona jogos de tabuleiro e continua a ver muitos filmes. Gosta de cozinhar, olhar o mar, ler.

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