Que um episódio chamado “Finalmente uma Lição” (episódio 30, temporada 3) consiga apelar às crianças é mistério que não conseguimos solucionar. Mas, como por aqui já anda gente um bocadinho crescida, isto talvez encaixe na perfeição.
Quem vai dar a aula, claro está, é o Robin, o mais certinho dos Teen Titans. Podemos sempre contar com ele para ser o adulto na sala. É um adolescente precoce. Ou, para os amigos e mais alguma gente, um chato. Ele é o tipo que quer melhorar as coisas, que pretende resolver as falhas, que está disposto a dar umas lições de vida aos companheiros.
Que lhes quer ensinar desta vez? O valor da amizade? A importância do amor? Qual quê, isso são coisas já muito batidas. A palestra deste episódio vai ser sobre “Como comprar imóveis para investir a longo prazo ou, por outras palavras, como investir em propriedades para arrendar”.
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A magia das palavras simples como… dinheiro
Isto promete, por isso pedimos à Starfire, ao Cyborg, ao Beast Boy e à Raven que nos deem um espacinho no sofá. Metemos um dedo no ar para perguntar, mais concretamente, de que vamos falar. Temos de gabar a paciência do Robin… São propriedades que se compram para outros morarem lá, explica. O que consiste numa das melhores formas de constituir capital próprio. Conseguem adivinhar a pergunta seguinte, feita pela Starfire?
Pois bem, segundo o Robin, capital próprio é aquilo que verdadeiramente nos pertence. Vejamos: se vendermos uma casa nossa e liquidarmos o remanescente do nosso crédito habitação, o dinheiro que sobrar é o nosso capital próprio. Parece simples, mas, na verdade, muito pouco heroico. O Cyborg já tem a cabeça à roda. E a Raven diz que aqueles termos lhe dão arrepios e que tem de descansar um pouco.
E se Robin, em vez daquela explicação técnica, dissesse aos amigos que capital próprio quer dizer… dinheiro? Ah, que palavra mágica. Ficam logo todos interessados em saber como é que podem ganhar muito dinheiro. Nós também. Mostra lá como vai ser isso, Robin.
Prédio degradado ou boa oportunidade de negócio?
Bom, diz ele, antes de mais, temos de encontrar o melhor imóvel para o negócio. No sítio onde eles moram a tarefa não será tão difícil como em Lisboa ou no Porto… Já tem em vista um prédio em mau estado, habitado por uma data de vilões. Mas onde uns veem fugas de água e bicharada rastejante, ele vê uma oportunidade de construir capital próprio. De fazer dinheiro.
O estado degradado do prédio permite que Robin faça uma proposta baixa ao proprietário. Quando esta é aceite, os Teen Titans são oficialmente donos de um prédio! Certo? Calma, ainda não. Segue-se a lição do financiamento que, nas palavras de Robin, é a forma de arranjar dinheiro para pagar a propriedade. Segundo os cálculos dele, as rendas do edifício vão cobrir a maior parte dos custos; ainda assim, precisam de arranjar 20% do montante, para a entrada. Solução? Telefonar ao Batman e dizer que precisa de dinheiro para instalar um laboratório anticrime. Uma mentirinha inofensiva.
O episódio inclui explicações sobre os detalhes do empréstimo bancário, a importância da pontuação de crédito de alguém… Tanta informação bate na cabeça como um martelo, queixa-se Raven. Pois é. Mas Robin sabe de outras coisas que batem com mais força. Ter uma pontuação de crédito baixa. Não planear o futuro. Não ter dinheiro para a reforma. Não ter dinheiro para viver depois da reforma.
Que culpa tem Robin de achar interessantes coisas aparentemente aborrecidas? Para ele, preencher papelada, como a declaração de impostos, é uma coisa fixe. É como desenhar palavras numa linha específica, com informação específica. Se ele o diz… Sim, o Robin diz muito. Mas é tudo aquilo que sabe que faz com que o crédito seja aprovado. Será que agora, finalmente, vem a tal parte do capital próprio?
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Garantir o futuro dá trabalho, mesmo num desenho animado

Num prédio a abarrotar de inquilinos vilões os planos saem algo furados. Mas, como os protagonistas principais são super-heróis… ei-los a desentupir sanitas e ralos de lava-louças, a arranjar fechaduras, a trocar lâmpadas nos corredores de acesso, a dar cabo da praga de insetos. Isto do capital próprio dá trabalho, diz Beast Boy. É dinheiro suado. Ainda por cima, Robin acabou de descobrir que o edifício tem rendas antigas, ou seja, os vilões pagam valores abaixo do mercado para os apartamentos que ocupam. Correr com eles? Despejar os patifes? Tecnicamente isso é ilegal, diz Robin. Só se eles quisessem sair por vontade própria…
Estes vilões são um bocado tontos e bastará apregoar num altifalante que a renda baixa que eles estão a pagar é um crime, que era bem melhor eles saborearem a liberdade do mercado livre, e ei-los a fazer as malas para se mudarem. Agora, sim, anúncios de apartamentos para arrendar, com rendas adequadas ao valor do mercado, e pronto, estão ricos!
Ainda não, avisa Robin. Leva décadas a construir capital próprio. Mas, enfim, dali a 30 anos vão ter algum dinheiro para pagar os medicamentos que a idade lhes vai exigir. Afinal, planear o futuro, mesmo num desenho animado, não é nenhuma brincadeira.
Paulo M. Morais cresceu a jogar futebol de rua e a ouvir provérbios ditos pelas avós. Licenciou-se em Comunicação Social e especializou-se nas áreas do cinema, dos videojogos e da gastronomia. É autor de romances e livros de não ficção. Coleciona jogos de tabuleiro e continua a ver muitos filmes. Gosta de cozinhar, olhar o mar, ler.
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