A série “Adolescência” assustou muitos de nós. Ninguém gosta de acreditar que não está no controlo daquilo a que os filhos estão expostos online. Já não era novidade que isso não é totalmente possível, mas a série veio expor alguns dos medos mais profundos de tantos pais... As barreiras da responsabilidade ficam muito difusas, e não é claro até onde é que podemos ir para prevenir que um filho nosso não cometa um crime como o exposto na série.
O primeiro ponto poderá ser fazer as pazes com o facto de não podermos controlar de facto tudo aquilo a que os nossos filhos estão expostos online. O segundo ponto é esquecer o primeiro e fazer tudo o que estiver ao nosso alcance na mesma, para os proteger do mundo digital. A verdade é que é nossa responsabilidade, mesmo sabendo que há tanto que nos pode escapar...
Os pais têm atualmente preocupações novas com as quais os seus próprios pais não tiveram de lidar. Estamos pela primeira vez, perante uma geração que sabe mais de um assunto (as tecnologias) que os seus pais e que muitas vezes tem de os ensinar. O que fazemos nós, cuidadores, se estamos a tentar protegê-los de algo de que não percebemos tanto quanto queremos acreditar?
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Ter horários e conteúdos definidos
É importante manter horários e tempos específicos para o uso dos ecrãs – há várias associações de pediatria online onde estas recomendações estão especificadas, não só em termos de tempo, mas também de conteúdo. Quando estes estiverem definidos, manter uma monitorização próxima é importante, sendo que crianças e especialmente, adolescentes, são muito hábeis em tentar dar a volta aos adultos neste tema.
Quando o jovem já tiver o seu telemóvel, este deve ser usado apenas em alturas específicas do dia e é importante que exista monitorização através de aplicações de controlo parental, onde poderemos definir limites de tempo e bloquear determinadas palavras e conteúdos.
Para além disto, principalmente com crianças mais novas, pode ser importante passar tempo com elas quando estão a ver televisão/vídeos online – a verdade é que, mesmo com recomendações acerca da idade, podem existir conteúdos que não são na verdade apropriados à sua fase de desenvolvimento e capacidade de compreensão. Adicionalmente, isto permite momentos importantes de partilha em família, que se podem tornar pedagógicos.
Cumprir as orientações das plataformas
Antes de permitir o uso de determinado jogo ou rede social, é importante ler as diretrizes das mesmas (quase todas têm um espaço dedicado aos cuidadores, com orientações específicas). Após termos informação da idade mínima de uso e do conteúdo existente na plataforma, é importante refletir sobre se o nosso filho tem maturidade suficiente para se envolver em determinada tarefa, sendo que as idades definidas por cada plataforma é apenas uma recomendação geral e não deve nunca substituir uma reflexão cuidada acerca do desenvolvimento e características da criança em questão.
É muito possível que um adolescente de 15 anos não tenha ainda maturidade para lidar com a complexidade do mundo online. Prova disso são as notícias a que estamos expostos todos os dias, com as redes sociais a ser palco de bullying e violência constantes.
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Monitorizar o nosso próprio uso de ecrãs
Uma das principais formas de aprendizagem de uma criança/adolescente, é a modelagem: a imitação de uma figura de referência. Se estamos demasiado tempo no nosso telemóvel, é normal que os nossos filhos queiram fazê-lo também. É quase como se estivéssemos a dar-lhes uma “autorização invisível”. Claro que, como adultos, temos mais liberdade de uso (até porque muitas vezes é instrumento de trabalho), mas devemos lembrar-nos de que a nossa casa deve ser um espaço o mais livre de ecrãs possível.
Deixar os telemóveis à porta de casa quando entramos pode ser uma boa ideia. Criar horários específicos para o seu uso pode ajudar, por exemplo, depois dos miúdos se deitarem (tendo cuidado para não exagerar no seu uso perto da hora de dormir).
Ter em mente as tentativas de “fazer batota”
Temos de estar preparados para o facto de que há muitas coisas online das quais os nossos filhos já vão perceber mais do que nós. A verdade é que muitos jovens já são hábeis a contornar as regras, seja através de VPN ou de alterações nas definições dos dispositivos. Em jovens que já têm mais liberdade para usar a internet, é importante manter uma vigilância próxima, continuando a respeitar a privacidade sempre que possível (exemplos de quando pode ser importante ver o telemóvel é se considerarmos que há risco do nosso filho estar em risco).
Não ter medo de conhecer
Em geral, somos bastante reticentes ao que não conhecemos e ao que pode ser desconfortável... a verdade é que muitos de nós não cresceram com telemóveis na mão. Tínhamos de esperar dias para ver alguma coisa na televisão e esperar estar em casa a essa hora. Os conteúdos a que assistíamos eram mais limitados, sendo que ainda não existia a gama de oferta que existe hoje. Para além disso, ataca-nos uma ideia quase geracional: no meu tempo é que era giro!
Muito do que se passa na internet são conceitos novos com os quais não estamos familiarizados. É importante que tenhamos a flexibilidade de conhecer o que se passa – com empatia e curiosidade. Se os jovens passam tanto tempo online, é porque lhes interessa, e se assim é, como cuidadores, temos o dever de nos interessarmos também. Para sua proteção!
Manter os ecrãs afastados do quarto e em momentos de lazer em família
Os ecrãs não devem em momento algum substituir oportunidades de interação em família – quando temos momentos de partilha e brincadeira, é aconselhável que os ecrãs se mantenham afastados. Mesmo quando ninguém está a utilizar ativamente, já tem vindo a ser apontado que altera a qualidade da relação!
Assim, a não ser que o plano envolva de facto ecrãs (ver um filme; ver um vídeo em família; jogar algum jogo), é aconselhável que possamos estar juntos sem os telemóveis e os tablets pelo meio, que olhemos os olhos uns dos outros e que estejamos plenamente presentes! Também é recomendável que o quarto seja um local livre de ecrãs, principalmente no que diz respeito às crianças.
É cada vez mais comum que existam televisões dentro do quarto ou que os miúdos adormeçam a assistir ao tablet. A verdade é que isto estimula o cérebro em excesso antes de dormir, além de que, se demasiado perto (como é o caso dos dispositivos de ecrã mais pequeno) inibem a produção da melatonina, a hormona que nos ajuda a dormir.
Temos a responsabilidade conjunta de não permitir que os ecrãs invadam a nossa vida familiar. Já basta a inevitabilidade de os jovens terem de lidar com a internet para sempre – é mesmo um caminho sem volta! Se a nossa casa estiver protegida, assim como as nossas relações, melhor.
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Psicóloga Clínica (C.P. 26342) de crianças e adolescentes no Instituto Belong. Experiência na dinamização de cursos de preparação para a natalidade e parentalidade. Membro fundador e dinamizador do Socializa.T, programa de promoção de competências sócio emocionais em crianças e adolescentes. A frequentar a Especialização Avançada em Psicoterapia no ISPA.
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