A fixação da prestação do crédito habitação vai permitir uma redução dos encargos imediatos com o empréstimo da casa. Mas não há qualquer perdão. O que significa que os clientes terão de pagar mais tarde o que não pagam agora. Saiba se renegociar as condições de crédito não é mais vantajoso.
A partir desta quinta-feira, 2 de novembro, é possível pedir a fixação da prestação de crédito habitação, no âmbito da moratória aprovada pelo Governo e determinada pelo Decreto-Lei n.º 91/2023. Quem recorrer a esta medida vai ter um balão de oxigénio no imediato. Mas, na prática, estará só a adiar o pagamento de parte da sua dívida.
Ou seja, a moratória é uma medida de ajuda às famílias que, num contexto de aumento dos juros, estão a sentir dificuldades em pagar as suas despesas. Mas não é uma medida sem “custo”. À semelhança do que acontece quando se pede uma carência de capital, estamos a adiar o pagamento de uma dívida.
E é assim que esta medida vai funcionar: adiando o pagamento de parte do montante que foi financiado. O que implica um custo final do crédito mais elevado. Não porque serão cobradas outras despesas, mas porque terá uma dívida mais elevada por mais tempo, logo, paga mais juros.
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Como funciona a moratória?
A fixação da prestação, de uma forma simplificada, vai ser determinada por um desconto calculado com base em 70% da taxa Euribor a seis meses, independentemente do prazo do indexante no contrato.
Encontrado o desconto a aplicar a cada caso, é “retirado” esse montante à parcela de amortização de capital. Na prática, o cliente passará a amortizar menos capital do que estava a fazer antes de a medida entrar em vigor.
Este valor do desconto é considerado “montante diferido” e será pago posteriormente. Assim, nos primeiros dois anos (período máximo da medida), pagará sempre a mesma prestação, com um desconto associado.
Ao final dos dois anos, retoma o pagamento normal, sem qualquer desconto. Mas também sem pagar o tal montante diferido. Só após mais quatro anos é que passará a amortizar aquele montante (isto se o contrato tiver mais de seis anos até ao seu término).
Apesar de estarem como que em rubricas diferentes, o montante total da dívida é a soma do valor normal da dívida acrescido do montante diferido. Pagando sempre juros sobre a totalidade do valor.
Para saber pormenores sobre como vai funcionar a medida leia Como vai funcionar a moratória do crédito habitação?
Qual o impacto na prestação?
De uma forma simplista, a fixação da prestação vai ditar uma redução dos encargos no imediato. Contudo, uma vez que está a adiar o pagamento de uma parte da dívida – porque não se trata de qualquer perdão, apenas de um adiamento do pagamento – o custo final do crédito será mais elevado. Isto porque está a pagar juros sobre o capital em dívida, e uma vez que está a adiar o pagamento de parte do empréstimo, os juros acabam por ser mais elevados.
Para ser mais fácil perceber o impacto da fixação da prestação, vamos dar exemplos:
Financiamento de 100 mil euros
Um crédito de 100 mil euros, a 25 anos, indexado à Euribor a 6 meses e com um spread de 1%, corresponde a uma prestação de 586,34 euros. Aplicar a este caso a regra da fixação da prestação é reduzir a mensalidade em 68,34 euros, colocando a prestação em 518 euros.
No caso de ter um empréstimo com as mesmas condições, mas indexado a uma Euribor a 3 meses, a redução da prestação será de 59,62 euros. No caso de ter um financiamento indexado à Euribor a 12 meses, a redução será de 75,30 euros.
Estas contas têm em consideração a média da Euribor de setembro, que é o último valor disponível.
Empréstimo de 150 mil euros
Se usarmos o mesmo raciocínio para um financiamento a 25 anos, de 150 mil euros, com um spread de 1,2%, a redução da prestação é de 103,61 euros, de 897,10 euros para 793,50 euros. Isto para empréstimos indexados à Euribor a seis meses.
Quem tiver um crédito com estas características indexado à Euribor a três meses sentirá uma redução de 90,48 euros. Já quem tiver a Euribor a 12 meses terá um "desconto" de 114,33 euros.
Empréstimo de 200 mil euros
Se analisarmos um financiamento de 200 mil euros, em que ainda faltem 30 anos para concluir o contrato, e tenha um spread de 1,5%, a prestação está nos 1.139,35 euros, tendo em consideração a Euribor a seis meses de setembro.
A moratória vai colocar esta prestação nos 992,21 euros, menos 147,13 euros do que o valor normal.
Se for um empréstimo nestas condições, mas com uma Euribor a três meses, a redução da prestação ronda os 128,50 euros. Já para quem tiver uma Euribor a 12 messes a descida é de 162,38 euros.
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E qual é o impacto da negociação das condições do crédito?
Há várias formas de reduzir os encargos imediatos com o crédito habitação: pode renegociar as condições oferecidas (nomeadamente o spread), pode prologar prazos, pedir uma carência de capital ou rever todos os custos associados ao crédito (como é o caso dos seguros). Mas para o exercício em causa, vamos apenas olhar na perspetiva da prestação e no custo do próprio crédito.
Assim sendo, pode tentar que lhe reduzam o spread ou analisar uma proposta de taxa mista. Estas duas soluções vão diminuir a prestação no imediato e reduzir também o custo do contrato a longo prazo.
De realçar apenas que esta negociação das condições pode ser feita junto do banco atual ou de outro qualquer, transferindo o crédito para outra entidade.
Mas vamos a contas:
Num empréstimo de 100 mil euros a 25 anos, com uma Euribor a seis meses, a revisão de um spread de 1,5% para 1%, corresponde a uma redução na prestação de cerca de 30 euros por mês.
Para o mesmo caso, se usarmos uma taxa mista, em que durante dois anos a taxa é fixada nos 3,65%, a redução da prestação é superior a 107 euros.
Em ambos os casos, a redução dos encargos é imediata e ao longo de todo o contrato, ao contrário da moratória, que reduz no imediato, mas acaba por encarecer o crédito pedido.
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O que acontece ao final de dois anos?
Se recorrer à fixação da prestação, ao final de dois anos (se as taxas Euribor não descerem para níveis abaixo do desconto que está a ser aplicado), passa a pagar a prestação “normal”. Ou seja, o desconto que está a ser aplicado termina. Passa, então a pagar juros e a amortizar capital normalmente. Só não paga a parcela de capital que ficou em montante diferido. Esse só pagará mais tarde.
Ainda assim, pagará os juros correspondentes, o que significa que, apesar de ter uma rubrica à parte com o “montante diferido”, está a pagar juros sobre esse montante, visto que a sua dívida é composta pelo capital total acrescido deste valor que não pagou ao longo dos meses de fixação de prestação.
Se, em vez de recorrer à moratória no crédito, negociar as condições de financiamento, através da contratação de uma taxa mista, com dois anos de taxa fixa, ao final desse período, passa a ter uma prestação calculada com base numa taxa Euribor e no spread acordado aquando da contratação da taxa mista.
Se a negociação passar apenas pela redução do spread, não há diferenças. Ao final dos dois anos continuará a pagar a prestação calculada com base no spread e na Euribor contratada.
Pedir fixação da prestação ou renegociar condições?
Contas feitas, há uma certeza: a fixação da prestação vai gerar uma redução imediata, mas um custo final mais elevado.
A medida de fixação da prestação foi desenhada para apoiar as famílias que começam a sentir dificuldades em cumprir com o pagamento das prestações, num período marcado pela subida expressiva das taxas de juro.
Já se renegociar o seu empréstimo, garante que está a ter as melhores condições financeiras que existem no mercado para o seu caso. Com uma redução transversal do custo do crédito.
Dito isto, se está a ter dificuldades em cumprir com o pagamento da prestação de crédito, esta medida foi feita para ajudar. Mas não deve ficar apenas por esta solução. Pergunte ao seu banco e à concorrência se não consegue reduzir os encargos. Se conseguir esta redução, através da renegociação das condições de crédito (através da descida do spread ou de uma taxa fixa/mista), o custo total do seu empréstimo vai ser menor.
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